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Artigos

  • Reciclando o terrorismo

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 03/03/2006

    As Nações Unidas vêm de criar Comissão de Alto Nível para enfrentar problema como o que a indescritível reação mundial às charges contra o Profeta tornou devastadoramente urgente. Não se imaginaria o atual porte da catástrofe quando, em novembro último, reuniu-se o grupo em Majorca, para ir ao fundo das conseqüências do 11 de setembro, e a retomada de uma possível cultura da paz. As últimas duas décadas do século XX podem ser vistas como quase uma "época de ouro", num começo de convivência de após a queda do Muro e de possível globalização num quadro democrático. Soam hoje como prematuramente obsoletas. Longe vai o tempo em que a política externa do governo Clinton evidenciava este largo propósito, antes que as lógicas da potência mundial remanescente cedessem às da hegemonia, por sua vez acirradas pelo terrorismo de Bin Laden.

  • As boas festas de Bin Laden

    Folha de São Paulo (São Paulo), em 02/03/2006

    As mensagens de Ano Novo de Bin Laden já se atropelam, a esta altura, pela vitória do Hamas ou pelo insulto ao profeta no algo de blasfemo que nos veio da Dinamarca. Mais ainda, o presidente do Irã se esmera em mostrar como já vai longe o tempo de Khatami e do pedido pelo diálogo das civilizações.

  • Enfim o acordão, Ufa!

    Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), em 28/12/2005

    Às vésperas das rabanadas de Natal o Congresso nos garantiu a digestão esperada da crise pelo grande acordão. Nada mais, nada menos do que o deputado Romeu Queiroz, de alcance estrondoso no valerioduto - nesses seus R$ 350 mil - sai ileso de qualquer castigo. Tutta bona gente, que o parlamentar é o amigão de todos, gente boa e gente fina, e não passa pela cabeça impor-lhe o desagrado da expulsão do paraíso. Vá o ano em paz, e por aí mesmo assegure esse as boas festas dos companheiros vistos a caminho do cadafalso, ainda há um mês. Como baixar-se o cutelo sobre os pescoços menos óbvios já que a acusação é a mesma, só que muitas vezes em ganho de trocados e não da lauta soma, pela qual o Conselho de Ética pretendeu tornar irretorquível o bater do martelo condenatório.

  • Retórica do diálogo e cultura do medo

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 23/12/2005

    As meninas de coletinhos de dinamite, que beijam os pais e explodem nos ônibus de Gaza, são comandadas por Bin Laden? Até onde o terrorismo é uma operação de guerrilha incessante e mundializada, fora dos grotões do mesmo comando e sua disciplina? Ou o que divisamos hoje é um gigantesco levante do inconsciente coletivo de nosso tempo, insubordinado com os preços do progresso a todo custo e a perda da alma de suas coletividades? Vamos ou não, afinal, entrar nas novas guerras de 100 anos, como prega o Salão Oval, diante da "cultura do medo", e de um mundo a perigo, de que as explosões de Madrid, ano passado, ou dos ônibus de Londres, nesses últimos meses, demonstram a permanência múltipla e generalizada? E como ignorar, nas montanhas do Paquistão o culto a Mohamed Ata, e a fotografia da sua passagem desafiante pelas roletas do aeroporto de Boston, a caminho da derrubada do World Trade Center?

  • O preço da cabeça de Dirceu

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 16/12/2005

    Nenhuma arruaça ou estrépito se seguiu ao placar contundente da derrubada de José Dirceu na Câmara. Embotaram-se até, gestos ou comentários, diante de um vazio que não some pela mera retomada das rotinas da casa, quando os ritos se cumprem, por demais, para aspirar-se a qualquer mudança. Pretendeu-se dar conta da crise, por uma lógica primária de compensação política. Mas a cassação aponta a um crescente desconforto-cidadão, que talvez seja o primeiro saldo de um amadurecimento político face aos golpismos moralistas, da tradição do País, reptado pelas eleições de 2002.

  • Caixa 2 do bem

    O Globo (Rio de Janeiro), em 15/12/2005

    A ida de Eduardo Azeredo à tribuna do Senado para renunciar à presidência do PSDB empatou o jogo da escalada das cassações. Aí está o jorro, democraticíssimo, do valerioduto, comprometendo todos os partidos no caixa 2, na prática universal da corrupção sistêmica, entre tucanos impolutos e petistas acima de qualquer suspeita. E aí está, pois, a proposta do líder Artur Virgílio, de levar-se adiante, como compete ao patriciado político do Brasil, a boa lógica dos “mais iguais”, a partir do país-bem. Vamos à lavagem da corrupção do bem - a que só pestifera o trigo e não o joio, e levemo-la à condescendência, senão ao perdão radical pelo Congresso, já hoje preso, sem retorno, à concupiscência dos acordões. Ingenuidade de Azeredo ou deslumbramento de Delúbio?

  • A crise depois de Dirceu

    Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), em 14/12/2005

    Todos os processos de cassação, exceto o de Rômulo Queiroz, passam ao ano que vem. Sem mais, pois que não há ânimo no Legislativo para as convocações extraordinárias. Não se vai à luta, pois, no romper do ano, mas tão-só - e se Deus quiser - depois do Carnaval, que ninguém é de ferro e o país precisa manter-se fiel à boa memória curta. Morre a crise de morte morrida, ou seja, a do cansaço mesmo, e do desfecho das duas cassações-símbolo, ou torna-se inútil diante dos jogos feitos implicitamente para o ano eleitoral e das apostas para chegar às urnas?

  • Bahia e o humanismo em nossa imprensa

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 09/12/2005

    O corte biográfico, todo, de Luiz Alberto Bahia é regido pela evolução mesma do nosso jornalismo, dentro da maturação da cultura brasileira. Na formação do meio século, pouco presente, ainda, a universidade, o jornalismo puro condicionou o jogo de nossas idéias políticas, e a nossa modelagem institucional. A trajetória do pensador combatente que ora perdemos é a dessas matrizes do país que saiu do establishment. Formado no Santo Inácio, exposto ao pendor natural pelo curso de direito, interrompeu-o para dedicar-se a imprensa. Seduziu-o o trato direto com a opinião pública, cujas vozes audíveis passavam por sobre os rigores do scholar, para responder ao sentido de participação no seu tempo.

  • Lógica da crise, lógica do racha

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 02/12/2005

    A chegada ao fim do ano é já a de uma prática política que mereça o seu prêmio, sempre mal lido pelos panteões sôfregos do sucesso de um governo. Pela bolsa-família e sua irradiação, pela acolhida reforçada de Lula no Brasil de base, pela perda de pé das dramatizações mediáticas, o real concreto parece garantir-se do passo adiante. Apesar do que até diga Lula, em função do que porta como testemunho da sintonia medular de um outro Brasil e força da sua dessofisticação às vertigens, agonias do "Brasil-bem", indignado, repetido.

  • Maio de 68 continua

    Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), em 30/11/2005

    A Queda da Bastilha fez da França a matriz do próprio conceito moderno de revolução e da ruptura das instituições, nascidas de uma consciência profunda da perda da sua legitimidade. A guilhotina de Luiz XVI marcava a virada de página dos absolutismos esclarecidos do começo do Estado-nação de nosso tempo. Paris, de novo, foi protagonista de Maio de 1968, a que, agora, quer se associar, com o mesmo chicote inesperado da insurreição, a força dos incêndios repetidos, que passaram da subúrbia parisiense a ameaçar mais de uma centena de cidades francesas. A sucessão de queimas de automóveis, num braseiro sistemático, sem líderes nem palavras de ordem, até onde indica um desses movimentos de um inconsciente social, tectônico, sublevado? Não estamos mais diante de uma intelligentsia vigilantíssima que levou ao século da enciclopédia, à instituição do ideal político da liberdade, igualdade e fraternidade.

  • A democrática fome de universidade

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 25/11/2005

    Há que esperar que de fato, na presente legislatura, a reforma universitária venha a ter toda a acolhida que merece, na amplitude de seu debate e na prioridade que ganhou na gestão dos ministros Tarso Genro e Fernando Haddad. Ela só vem se somar ao resultado e ao êxito do projeto do Prouni e a ganho de uma efetiva e verdadeira mudança qualitativa nas expectativas de acesso de uma nova geração brasileira, nos seus grupos menos favorecidos, ao ensino superior. São, na verdade, cerca de 1 milhão e 200 mil jovens já hoje capacitados a chegar ao campus mas que não se logram juntar aos 4 milhões e 200 mil universitários brasileiros.

  • O impeachment a sopapo

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 18/11/2005

    O senador Bornhausen vem de conclamar os cidadãos a pedir o impeachment do presidente. Apela ao precedente de Collor. Mas, ao mesmo tempo, reconhece a inviabilidade de que, dentro do quadro partidário, a iniciativa possa ter qualquer chance. Esgota-se o maquinário da oposição no Congresso, tanto à falta de provas quanto à exaustão da crise.

  • A nudez paradisíaca do caixa 2

    Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), em 16/11/2005

    Arrastamo-nos esses meses pelo inédito da crise despertada pelo ''mensalão''. O espanto só cresceu por envolver o dito partido diferente, na sua promessa e fé de ofício petista. As últimas falas de Lula devolveram o sobressalto à sua velocidade de cruzeiro. Se pecou o PT o fez dentro do óbvio de uma mazela brasileira que vem do nepotismo da Velha República, passa pelas clientelas e valerioduto, apenas modernizou a corrupção. Seus respingos, agora simetricamente, caíram sobre os governos antecedentes e macularam tucanos impolutos, como petistas acima de qualquer suspeita. Anderson Adauto, ex ministro dos Transportes, não está não só no paraíso da corrupção. Ninguém precisou de folha de parreira para conviver na promiscuidade do caixa 2, de todos os tempos e todas as legendas. Atirem a primeira pedra - ou o lençol - as direções partidárias que não sabiam - ou deixaram de coletar - os dinheiros não contabilizados que são a segunda natureza do sistema, até hoje.

  • Dinheiro de Cuba e ouro de Moscou

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 11/11/2005

    O avanço desses meses só mostrou a recorrência dos reflexos obsoletos de abate do presidente nos jogos de instabilidade que se permita ainda um status quo. Recuaram, a seguir, no apelo ao impeachment, mantido como não tão obscuro objeto do desejo permanente e de uma oposição, a experimentar, pela primeira vez, o alijamento do poder. Todo novo apelo a um dito dossiê "arrasador", como o do dinheiro cubano, volta à tona da primeira investida, borzeguins ao leito, da fantasia e da provocação. A meta, sim, é a do corte de toda proposta de reeleição e a troca por um fim de mandato descolorido e inerte de uma Presidência refém de que não se peça agora o seu impedimento.

  • O supremo entra na crise

    Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), em 28/10/2005

    Talvez não exista critério mais claro da chegada da crise aos seus limites que de uma intervenção inovadora do Supremo no usar, ao lado da guarda da Constituição, o seu poder de normalização do sistema. Nessas interpretações extremas do que seja manter a Carta Magna do País, a Corte se investe da latitude que lhe permita este valor profundo pelo nosso Estado de Direito. Ela não está vinculada ao espartilho das súmulas, nem deixa de levar a interpretação da lei que recomenda o melhor direito romano, no respeito ao bem comum. Há um intrínseco poder moderador da mais alta Corte, que se exerce em favor da estabilidade geral da nação, quer contendo o fio do legalismo extremo, quer não fugindo à norma inovadora, rebelde ao precedente.