Sobre as dez razões de um cronista
Numa primorosa crônica, Luiz Fernando Veríssimo apresentou dez razões para aceitar de conhecido empresário um milhão de dólares. No meu caso, ouso apresentar dez razões para a rejeição dessa oferta:
Numa primorosa crônica, Luiz Fernando Veríssimo apresentou dez razões para aceitar de conhecido empresário um milhão de dólares. No meu caso, ouso apresentar dez razões para a rejeição dessa oferta:
Outro dia, o grande jornalista e meu amigo, Ancelmo Góis, em sua notável coluna, assegurou que a minha História da Literatura Brasileira foi levada pelo dinâmico editor da Leya, de São Paulo, para o senador e escritor José Sarney e esse levou em mãos um exemplar para Dilma Rousseff, o que me deixou contente. Não por ter intimidade com o poder - já que até agora não me foi conferida essa faculdade, e os que a tem,devem guardá-la eficazmente para si.Nem por ser velho amigo da presidenta (vou usar essa expressão em sua homenagem), já que é a primeira mulher, entre nós, a execer tal cargo e o conhecimento da língua não o veda), desde o Rio Grande do Sul, de onde vim e ela viveu longo tempo e ocupou cargo importante.Se minha intimidade é a convivência da mesma terra e se esse "conviver" nos proporciona o mesmo clima, a mesma paisagem, a mesma temperatura do coração, então sim. Pois a terra é sempre um dom, equilíbrio e nascença da alma. Mas a paixão por Guimarães Rosa que nos une, e a justeza do empenho em trazer de volta ao Brasil Abaporu de Tarsila do Amaral.
A perda no futebol para a França, recentemente e mais uma vez, deu uma golfada de realidade, que é mais sadia do que o ufanismo que nos embalava como os melhores do mundo.
Maria Bethânia é um grande nome de nossa música popular, não apenas pela voz, mas também pela sábia pronúncia das letras. E mais, pelo senso poético.
No instante em que o mundo se volta para a tragédia do Japão, com os terremotos, o tsunami, e, depois, a liberação da nuvem tóxica altamente radioativa; consequencia de avarias nas usinas atômicas trazendo o envenenamento da população, apareceu uma fotografia comovente na capa de alguns jornais, que diz muito do desespero. Uma japonesa chorando à terra em que enterrou sua mãe e que,num hausto, abrindo vereda na morte, ainda conseguiu estender a mão para fora.
Quando abriu a vaga, por falecimento do amigo e conterrâneo, Vianna Moog, estava em Guarapari, na praça central, e li uma crônica de Josué Montello,com o título, se não me engano,"Um gigante sorridente", saída no Jornal do Brasil, e jamais pensava eu que a mão frutuosa de Deus estava me levando para ocupar exatamente aquela vaga.
Camoneanamente, ou não, lembramos a "dor das coisas que passaram". Em Virgilio Maro, o poeta de Mauá, já lemos essa expressão de mémória do sofrimento passado.
O sucesso no Brasil para alguns é motivo de raiva e cria desafetos. Alguém disse isso antes de mim, acho que foi o maestro Antônio Carlos Jobim. Não importa, é o que sucede.
Adélia Prado, poeta mineira, confessa que "biografias são desejos". Não sei se o são. Sei que elas se recobrem de camadas de alma. Como as folhas tampam, a ramagem da árvore.É verdade que entram fatores políticos, sentimentais e históricos numa biografia. Porque nada vem sozinho na escrita.
Escreveu um texto belíssimo sobre a palavra, Eduardo Galeano:"O Paraguai fala o idioma dos vencidos (o guarani). E a coisa mais estranha ainda: os vencidos acreditam, continuam acreditando, que a palavra é sagrada, porque ela revela a alma de cada coisa. Acreditam os vencidos que a alma vive nas palavras que a dizem. Se eu dou a minha palavra, me dou."Isso deve também suceder com a língua dos vencedores, porque sagrada persiste sendo a palavra. Sombra da grande Palavra que fez o céu, a terra e as estrelas. Sombra daquele que é a Palavra.
Conheci José Guilherme Merquior. Foi meu confrade e amigo, o que considero um privilégio. Viveu 50 anos e era como se tivesse vivido um século. No auge da intensidade e do fulgor. Foi um erudito sem perder a humanidade; foi inteligentíssimo, para não dizer cintilante, sem esquecer o toque, "a essência real que o tato exige", na expressão feliz de Lope de Vega.
Não vou pregar, de início, como Pe Antônio Vieira aos peixes, simplesmente vou deixar que os peixes preguem a nós, humanos. Podem ter lá seu sermão com versículos da maré. E de minha parte, serei atentíssimo ouvinte.
Com júbilo, como brasileiro, já vislumbramos a personalidade independente da presidenta Dilma Rousseff, o que pressentimos, ao conhecê-la pessoalmente, antes de sua candidatura. A autoridade para governar, a segurança nos objetivos que separa - e ainda bem - a gestora comprometida na responsabilidade da administração pública e o astucioso e mirabolante ser político, esse que cede aqui e ali, para dominar adiante, sem prever o prejuízo presente ou futuro.
"Os ditadores estão caindo um a um como jacas" - escreveu o mestre cronista Luiz Fernando Veríssimo. Também é suspeitável a hipótese de que tais ditadores fossem jaqueiras que dessem espinheiros, certa mescla inabitual dentro da natureza, mas bem provável no dúbio mundo da política.