Canoa furada
Desvio de formação e gosto, tenho uma atração fatal: a de embarcar em canoas furadas. Detesto chutar cachorro atropelado e, se não dou razão aos crucificados, tenho simpatia e respeito por eles.
Desvio de formação e gosto, tenho uma atração fatal: a de embarcar em canoas furadas. Detesto chutar cachorro atropelado e, se não dou razão aos crucificados, tenho simpatia e respeito por eles.
Insisto na imagem que aprecio: uma borboleta bate as asas na Tailândia e um furacão destrói metade da Flórida e de Cuba. Nem sempre a causa é proporcional ao efeito. Citando esta filosofia de almanaque, entro no assunto.
A hipocrisia é condenada por todos, mas é nela que se baseia a sociedade humana, da qual todos são defensores, menos eu, que de mau grado pertenço a ela. A consideração pode parecer rabugenta, e o é, de fato. Mas como reagir à inspeção nuclear que uma comissão veio fazer no Brasil para ter certeza de que não estamos produzindo uma bomba atômica?
Se tinha dúvidas, elas acabaram. Sempre me considerei um ignorante, que nada sabia de nada, mas vez por outra, como ser humano sujeito aos mil acidentes da carne, tinha a veleidade de achar que não era bem assim, talvez soubesse alguma coisa, nada de importante, como o todo é maior do que a parte e quem parte leva saudade de alguém.
Mais uma vez, e como sempre, estou na contramão do consenso, um dos quais, em época eleitoral, é a importância do debate na TV entre os candidatos a cargos eletivos. Os marqueteiros e colunistas especializados acreditam que Kerry diante de Bush, ou Marta diante de Serra, consumidos pelos milhões de telespectadores que acumulam a função de eleitores, ganharão ou perderão de acordo com a performance diante das câmaras.
O almirante Faria Lima foi o último governador biônico do então Estado da Guanabara. Durante o seu governo, houve a fusão com o Estado do Rio, a maior truculência cometida pelo regime militar contra os cariocas e fluminenses.
Boa a repercussão da morte de Fernando Sabino na imprensa. Mais que merecida. Contudo, na maioria das notas publicadas, houve a reincidência de uma crítica profundamente injusta ao fato de Sabino ter escrito um livro cujo personagem principal era a ex-ministra Zélia Cardoso de Melo.
Houve tempo em que minha auto-estima andava lá em cima. Comprara um carro do ano, importado, o carro fazia sucesso, e minha estima pelo auto chegou às nuvens. Vivendo hoje mais modestamente, com carro nacional já velho de dois anos, não tenho motivo para estimá-lo, embora o trate bem e ele me retribua com excelente tratamento, nunca me deixando na mão.
Entre as muitas coisas que não entendo (na realidade, cada vez entendo menos de tudo) estão as previsões e análises eleitorais dos entendidos na matéria, os profissionais da política, os cientistas políticos e os colunistas especializados no assunto.
Sempre que lhe perguntavam o que queria ser quando crescesse, Fernando Sabino respondia: "Quero ser criança". Uma boa resposta, que ele não conseguiu realizar ao longo da vida. Pois nunca deixou de ser um rapaz, um bom rapaz. E, como bom rapaz, foi campeão de natação no Minas Atlético Clube, casou, teve filhos, escreveu livros, tocou bateria, viajou muito, estava sempre pronto para um papo inteligente e divertido.
Não sou Paulo Maluf, nem paulista, nem paulistano. Mas gostaria de ser, pelo menos até a véspera do segundo turno, quando se conhecerá o prefeito da capital. Poucos seres humanos, ao longo da história, estarão vivendo um estado de graça absoluto como ele.
Não faz tanto tempo assim. A moça me telefonou, convidou-me para almoçar numa cantina do Leme, disse que o assunto era urgente e importante. Como morava perto, fui ao almoço e me surpreendi: a moça existia mesmo, estava bem vestida e era muito, muito bonita.
A polarização entre o PT e o PSDB, indicada pelas eleições do último domingo, desmente o princípio básico da democracia, ou seja, que o poder emana do povo. A expressão da vontade popular, que elege seus dirigentes mais próximos, deveria estabelecer a cadeia do mando público a partir dos vereadores e prefeitos, uma vez que, antes de habitar um país ou um Estado, todos habitamos uma cidade.
Deveria estar comentando as eleições do domingo passado, conforme pedem alguns leitores. Mas sou retardado, como dizia meu pai. Deu-se que, em remoto tempo, ele foi fazer uns consertos em casa, subiu numa escada dessas que abrem e fecham, a escada perdeu o prumo e, para não cair, ele se segurou precariamente numa saliência da parede e gritou por mim, pedindo socorro.
"Metade das empresas consultadas no Brasil, em pesquisa do Banco Mundial (Bird), informou haver pago propinas a funcionários de governo e 67,2% avaliaram a corrupção como obstáculo importante à atividade econômica. A confissão do crime por 51% das empresas pode ser a grande novidade, mas outros problemas têm maior destaque na lista das preocupações. Insegurança quanto às políticas, por 75,9%, e condições de crédito, por 71,7%."