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Revista Brasileira nº. 118 (2024. 192 pp.)

Essa publicação faz parte da coleção Revista Brasileira

Editorial

Rosiska Darcy de Oliveira

Ocupante da Cadeira 10 na Academia Brasileira de Letras.

De onde vem o erro? Quem pergunta é Edgar Morin, que aprendeu com mais de um século de vida a nunca ter certezas inabaláveis. Imbuído do mais fino espírito científico, sabe que a ciência é uma acidentada aventura de ensaios, erros e retificações. Nada mais sábio em tempos sombrios, de certezas pétreas, polarizações e cancelamentos, de sim ou não, tempos alheios ao desassossego da dúvida.

É um privilégio e uma honra tê-lo conosco, iluminando esse número da Revista Brasileira em que se impõe a realidade da vida virtual, para a qual deslizamos dia a dia, que hoje compete com a vida real e vai se tornando a vida real de um século que mal começa. Ora, os algoritmos não convivem com incertezas, querem escolhas precisas, impondo sua episteme binária à inquietação do pensamento, onde, férteis, trabalham as interrogações.

Da arte e da vida de Vik Muniz emergem também os mistérios da ilusão, a mágica das transformações, os muitos possíveis da percepção quando a escolha do artista é a liberdade e o encontro marcado com o olhar do outro, em algum lugar imprevisível, que será sempre o da experiência de cada um. Tão múltiplo quanto ele mesmo é o olhar de Vik, o paulistano, o baiano, o carnavalesco carioca, Vik o veneziano que expõe à beleza do Grand Canale a tragédia dos náufragos das costas de Lampedusa. Em suas mãos, um prato de espaguete se transmuta na Medusa de Caravaggio.

A história tem sido o registro de muitos enganos. Alberto da Costa e Silva, que há pouco nos deixou, diplomata em posto na África, logo percebeu que os escravizados que aqui chegaram não nasceram nos porões dos navios. Corrigiu a história oficial que fazia economia do passado dessas populações e foi buscar na África de que pouco se sabia, um entendimento do Brasil, cego a seus ancestrais. Desvendou um Brasil africano, herança de um continente desconhecido. Talvez só um poeta pudesse ter ousado essa história. Era como poeta que se via. E poeta foi. Poeta maior. O esboço para um retrato de Alberto é nossa homenagem ao Acadêmico Costa e Silva.

Trazer ao presente os que não devem ser esquecidos é regra de ouro. Aqui ressurge o grande Mário Pedrosa, a quem a arte brasileira deve o entendimento de si mesma. E o país, a consciência de que a arte tem um papel estruturante na mudança das mentalidades. O que lhe foi reconhecido por Picasso, Miró e Henry Moore, entre outros grandes artistas e amigos que o defenderam contra as acusações e ameaças da Ditadura Militar.

A literatura vertebra a Revista Brasileira no reencontro com os esquecidos, João do Rio e Lucio Cardoso, e no encontro com os que estão escrevendo o melhor da literatura contemporânea. Na arte da tradução ou nas surpresas dos achados literários. Também na saudade de García Márquez, em seu livro derradeiro, Em agosto nos vemos. Ou quando a ABL, portas abertas, traz às nossas páginas Literatura e Música, Manuel Bandeira, Villa-Lobos e tantos outros protagonistas dessa história comum.

A Ciência guarda seu lugar cativo na Revista, dessa vez nos ensinando como aproveitar o terceiro ato de nossas vidas e o que nos faz humanos.

Na alegria festejamos o centenário de nossa casa, o Petit Trianon e sua teia de significados.

Edgar Morin, hoje com 102 anos, não nos adverte apenas contra o erro. Aconselha a viver poeticamente, correndo os riscos da arte e do imprevisível. A esse sábio, sócio correspondente da ABL, agradecemos a sabedoria de seus bons conselhos.

Ficha da Obra

Ano: 
2024
Páginas: 
192
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