A tecnologia cibernética e a globalização dificultam muito a vida dos escritores viajantes, cujos veneráveis patronos talvez sejam Heródoto, Marco Polo e, no caso da língua portuguesa, o grande Fernão Mendes Pinto, também ingratamente conhecido como "Fernão, Mentes". Era muito bom, quando se podiam fazer relatos assombrosos de monstros marinhos que engoliam navios inteiros sem mastigar, reis e imperadores que moravam em palácios de ouro maciço, rinocerontes voadores e portentos para qualquer gosto ou fantasia. Sumiram até mesmo os mentirosos de renome local, como os de Itaparica, hoje reduzidos a uma meia dúzia desalentada, que não pode competir com a tevê e mal reúne plateias minúsculas de dois ou três gatos-pingados, mesmo assim descrentes, desrespeitosas e contestadoras, que duvidam até de façanhas singelas, como a descrita numa das histórias contadas pelo finado Lamartine. O tocante episódio teve início quando o papagaio de Lamartine, presente da sua dele santa esposa, a também saudosa dona Naninha, fugiu de casa, onde vivia solto, poucas semanas antes de seu dono chegar à então avançada idade de sessenta anos, ocasião festiva para todos.