O governador Sérgio Cabral é um político, conheço-o pessoalmente de eventuais encontros na Casa de Machado e já o tenho criticado, com a mesma liberdade da velha expressão de Gaspar Martins, de que "as ideias não são metais que se fundem". Mas o nobre governante do Rio é um velho marinheiro" -não na idade, na experiência. E é um político:aquele que procura resolver os impasses. Cabendo-lhe, como dizia o goleador Dario, ser mais "solucionático, do que problemático."
Injustiça. Os bombeiros são heróis de nosso povo, todos sabem como se sacrificam em seu ofício contra o fogo que é inexorável, imperioso, destruidor. E eles o domam, apagam, eliminam com a água das mangueiras, com as mangueiras de sua vidas.
Não sei o tamanho da injustiça que os moveu a se amotinaram - eram mais de 450 , um batalhão de almas. Decerto, mais do que opressores, são vítimas de um desequilíbrio, seja da falta de condições materiais para o seu trabalho, seja pelo vergonhoso e apequenado salário, seja pelo esquecimento do que fazem, esquecimento que começa a invadir muitas instituições, seja pelo clamor diário do desgaste e da surdez da administração pública, seja pela inconsciência. Nenhum motim é admissível, mas há um outro tipo que também avassala e não é menor, o da consciência da injustiça. Contra esse não há tribunal que alcance jurisdição, salvo o do povo que está vendo, testemunhando, apoiando em silêncio a resistência.
Não é um bombeiro preso - e isso já bastaria - são muitos e muitos que estão encarcerados, quando ninguém pode encarcerar o direito de justiça, o direito de equânime salário, o direito inquestionável de dizer "não" ao que sucede com eles, o direito de esperar tratamento mais condigno de um político, atual governado , a quem boa parte elegeu e que não pode ignorar os bombeiros, heróis do povo, sim, amordaçados porque não possuem, por serem militares, o mais comezinho direito de greve.
O governo não, jamais pode ignorá-los no laço de humanidade que nos reúne, ou na compensação mínima pelo bem que já realizaram ou a honra que ainda merecem, porque o direito se recebe de pé. Jamais haverá para eles apenas a justificativa da palavra" vândalo" (tão antiga e indefensável, como era na ditadura a palavra "subversivo"), quando devem ser imediatamente libertos. Pagando o que devem,sim, mas percebendo igualmente o que lhes é devido em dignidade, para que o tempo e a paixão não obliterem a memória das coisas. Ou não haja mais memória.
Jornal do Commercio (RJ) ,13/6/2011