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Emily Dickinson

 

Ela era tímida, reservada; amou e não conheceu o amor.

Escrevia versos e não achou quem os publicasse.
 
Nem da fama soube. Ou da riqueza. Mesmo do poder. Nem o nome do que governou sua cidade é lembrado. Era americana de Amherst, Massachusetts, como podia ser alemã ou francesa.
 
Sua pátria tinha, sem saber, o território do coração do homem. Apesar de, enquanto viva, não receber dos humanos nem a confiança, nem a jubilosa piedade.
 
Afetada de forte nostalgia, gostava de cuidar do seu jardim, e com suas flores pressentia que a terra e o céu possuem igual instinto de rebrotar, até a alma.

Escrevia como se os versos olhassem para o futuro com tal desprendimento, que não permitiam que sua autora tivesse sequer presente. E até ela a renegou.

E o passado não é sempre o que nos foge desta gaiola, a memória?

Teve, como raros, a percepção da efemeridade das coisas, adivinhou a morte e seu musgo sobre os lábios.

Era só, lúcida, perseverante. E tinha a misteriosa certeza de que o tempo a encontraria e seria justo. Nalgum lugar desconhecido. Além da duração do seu corpo.

E o amor que não teve, alcançou seus versos, como uma lanterna durante a noite.

E a vida que lhe foi estreita, tornou-se pródiga e benevolente.

Dizia-se " a mais insignificante da casa, a que toma o menor quarto". E se a terra lhe parecia demasiadamente grande, ficou agora pequena. Por não pertencer à terra, mas aos sonhos.

Escreveu que "morrer sem morrer / viver sem vida / é  o mais árduo milagre". E assim foi. Porque ela mesma era um milagre. Chamou-se Emily Dickinson. E seus versos são imortais.

Diário da Manhã (GO), 5/5/2011