"Os ditadores estão caindo um a um como jacas" - escreveu o mestre cronista Luiz Fernando Veríssimo. Também é suspeitável a hipótese de que tais ditadores fossem jaqueiras que dessem espinheiros, certa mescla inabitual dentro da natureza, mas bem provável no dúbio mundo da política.
Mas vamos considerar que as árvores das ditaduras dão jaca - sempre pensei que dessem peçonha - então os ditadores já estavam caindo desde o início, há anos, só o povo não viu. No Egito e nas repúblicas congêneres. Todos compõem o misto de atores trágicos e bufões. Estavam caindo desde quando transferiam fortunas para contas secretas em bancos no exterior, estavam caindo ao determinarem a tortura de suas vítimas,estavam caindo ao subtrair do povo os mais comezinhos direitos. Ou quando substituíam a ação pelo discurso, o bem da população, pela propaganda organizada, ou forma de permanência no poder. Os ditadores estão caindo, como a ditadura na Venezuela, sem perceber, ou a do Irã, no tempo certo, só que o resto do mundo ainda não sabe, por não sentir o mau cheiro na proximidade da árvore.
Mas é de felicidade que de repente o povo tenha tido a visão avassaladora de que os ditadores são jacas podres no pé da história. Bastando dar um empurrão no galho e se esborracham no solo. Com os frutos bichados. Só que é preciso salvar o país de seu rastro sinistro. Porque todo um sistema apodreceu com eles. Ficou contaminada parte de sua história. Ou algo de poderosas civilizações.
A surpresa é a de como custa tempo a um povo absorvido pelo terror e quotidianas ilegalidades, dar-se conta, ou descobrir que o ditador é uma jaca bolorenta ou morta no pé. Ficando livres no instante em que deram atestado de óbito a tais defuntos, enterrando-os na cova silenciosa dos sucedidos. Ou da mais terrível memória.
Diário da Manhã (GO), 3/5/2011