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Biografias

 

Adélia Prado, poeta mineira, confessa que "biografias são desejos". Não sei se o são. Sei que elas se recobrem de camadas de alma. Como as folhas tampam, a ramagem da árvore.É verdade que entram fatores políticos, sentimentais e históricos numa biografia. Porque nada vem sozinho na escrita.

Mas há verdades íntimas, solitárias, insolúveis que se escondem atrás da memória e não querem vir à luz. Porque a memória é dor e nem sempre se expõe.

Biografias são desejos, ou apenas acontecimentos desdobráveis,como pano de vozes sobre o que alguém viveu e o que mais fundo ou dolorido levará com ele.Apenas a pedra continuará a absorver a penúria ou a grandeza dos homens.

E quando são biografias de heróis ou de santos há uma tentativa esperançosa de captura dos elementos que fizeram a diferença. E às vezes são tão tênues, que se indaga nos santos ou nos heróis, estes ambulantes da demência, seja de Deus, seja da Pátria, o que se ocultava de tão miraculoso, se tantas vezes foram comuns. Por que alguns gestos de repente se levantam, como se um país, ou o olhar do Altíssimo na espessura terrestre? E é interessante que a própria Adélia Prado, noutros versos, interroga: "Existe santo alegre ou são os biógrafos que os põem assim felizes como bobos?" A resposta não está nos biógrafos, está na loucura da santidade, a venturosa loucura de amor de quem se vê diante de Deus.

Diário da Manhã (GO),7/4/2001