No instante em que o mundo se volta para a tragédia do Japão, com os terremotos, o tsunami, e, depois, a liberação da nuvem tóxica altamente radioativa; consequencia de avarias nas usinas atômicas trazendo o envenenamento da população, apareceu uma fotografia comovente na capa de alguns jornais, que diz muito do desespero. Uma japonesa chorando à terra em que enterrou sua mãe e que,num hausto, abrindo vereda na morte, ainda conseguiu estender a mão para fora.
Não sei o que pensar dessa mão absoluta, imperiosa, acima dos acontecimentos, essa mão que ainda acredita na sobrevivência do povo. Esta mão que buscou , inesperada, a filha no meio da calamidade, esta mão que se levantou como um sinal, uma advertência do futuro. Ou derradeiro ato de amor, fugindo dos limites da ruína, mão de mulher que escapou do soterramento, para avisar que algo ainda resiste, algo é bem maior que a destruição ou a dor, algo que é da força do espírito diante dos abalos da carne.
Nao sei o que pensar do sofrimento dessa filha, cujo nome não é escrito, nem murmurado, ficando apenas a imagem de nossa transitória condição, imagem que também desaparecerá na vertigem das notícias. A filha chora a perda, a nação nipônica chora o desastre e o mundo,perplexo, assiste ao espetáculo de horror e do medo.
Não sei o que pensar, leitores da agonia da mãe sob a terra, nem da terra que a esmagou insensivelmente. Mas há, contudo, esta mão que saiu de dentro da escuridão, saiu como parte viva que não aceita a derrota, que não aceita o jugo do que se extingue, que sabe , como ninguém, que o amor pode tudo, que o amor é invencível. Sim, invencível como esta mão que repreende o terror, a estupidez e avança para a vida.
Diário da Manhã (GO), 23/3/2011