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Minha pátria,onde não canta mais o sabiá

 

A perda no futebol para a França, recentemente e mais uma vez, deu uma golfada de realidade, que é mais sadia do que o ufanismo que nos embalava como os melhores do mundo.

Gonçalves Dias viu o sabiá e era tão belo o gorjeio que, ali mesmo, o chamou de "pátria". Talvez porque era um sabiá com ouro na garganta. E estranhamente, o sabiá não cantou na África, nem as chuteiras inefáveis de nossos jogadores brilharam. Dunga militarizou o time e só faltou marchar com a banda improvisada pelo campo, e isso é belo, mas esdrúxulo quando o que se espera é a habilidade com a bola. A genialidade ausentou-se, não havia rosto algum de Brasil, era estratégia europeia, o jogo mecânico europeu, evidentemente não cantava o sabiá. Com Pelé, Garrincha, Jairzinho, Rivelino e Tostão  os pés sabiam gorjear a canção da pátria. Era a Holanda que imitava os passes e a mágica do Brasil de antanho. Roubaram o nosso poço, o nosso insondável abismo. Agora, há um mês, quando pensávamos que algo mudara com o treinador Mano, em Paris, assistimos um espetáculo como na África, em que os jogadores medianos tomaram o lugar dos craques. Mais o desvario da inaceitável violência em campo, que antes nos prejudicou e voltou a suceder.

É um alívio de libertação podermos receber em plena cara o vento forte da realidade, saber bem o que somos, retirar a máscara solene para que voltemos a viver, jogar, criar sem culpa, sem a mediocridade, este vírus teimoso, devastador.

Vamos voltar a ser nós mesmos, porque se o espírito de infância não retornar ao futebol, que retorne à vida, ao reino dos sonhos. Até que os leitores no pálido céu da pátria, volte a cantar o sabiá, o de garganta de ouro.

Diário da Manhã (GO), 21/3/2011