As fábulas podem ou não nos trazer lições.Mas, como nos adverte Jorge Luís Borges, bastam as fábulas, por nos levarem as lições de um inadequado moralismo.Pois a fábula já é a lição. Como não há que falar na ponte, se estamos no rio.
Um pé de amoreira na casa de meu pai, em Gramado, onde vereneava, tinha coplosas infâncias no tronco. E ali eu ficava conversando com a árvore, e ela comigo,desafiando a neblina tão amiudada, ou a chuva com a sua tromba de solidões.
Um pé de amoreira era onde cabia toda a ainfância e o céu das tardes e a lua das travessas noites, açurarado com as memórias, o melado puxando abelhas, os pássaros puxando os ramos e os passarinhos bicavam, esquisitamente as amoras.
Só restava o cheiro delas a invadir a infância, a invadir as memórias, como se ali todas as fábulas caminhassem na relva.
E eu carregava o milho para os passarinhos, carregava algum miolo de pão para que me rodeassem.
As horas se juntavam aos dias e minha cabeça se distraía como o levedar do vento.
Sim, toda a minha meninice cabia naquele pé de amoreira e era cívica a alegria daquela pátria que se ameigava em mim, ainda que a pátria da infância começasse no amor.
Por que esse consolo da infância é tão absurdo, longevo, embebedado de amoras? E sem saber me embebedava de céu. E Deus conhece Deus como ninguém.
Diário da Manhã (GO), 17/2/2011