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ABL na mídia - Estadão - Como uma pergunta ouvida por Ana Maria Machado de sua filha há mais de 40 anos virou seu novo livro

 

Aos 82 anos, a autora de livros infantis e adultos Ana Maria Machado acumula mais de 100 publicações de livros no Brasil, 20 traduzidas para outros idiomas, e cerca de 18 milhões de exemplares vendidos até 2023. Multipremiada, ocupa a 1ª cadeira da Academia Brasileira de Letras desde 2003, e presidiu entre 2012 e 2013, sendo a primeira escritora de livros infantis a atingir esse feito. Com mais de 60 anos de carreira, ela ainda cumpre compromissos literários e presença em eventos, como na Bienal do Livro nesta semana (veja programação abaixo), para falar sobre a publicação de três obras e ser entrevistada por crianças.

O livro Sem Fim, Joaquim, seu mais novo livro infantil lançado pela editora Moderna, narra a história de um menino que deseja contar tudo à sua volta, das folhas das árvores aos grãos de areia, até que descobre o significado de ‘infinito’. Essa revelação o faz questionar o mundo em que vive.

A inspiração para a construção dessa obra aconteceu há cerca de 40 anos, quando sua filha Luísa, na época aos 5 anos, perguntou se poderia contar os grãos de areia da praia em que estavam, no Espírito Santo. “Foi uma observação dela, na época. Ela perguntava quantas conchas tinham na praia, quantos peixinhos tinham no mar, quantas gotas de água tinham no mar”, lembra Ana Maria Machado. Em um estalo, a autora se lembrou desse episódio de descobertas de sua filha, e resolveu que daria uma boa história infantil.

Filha de pai jornalista e mãe professora, seu hábito com a literatura faz parte de sua vida desde pequenina. A criatividade da autora vem de seu contato com a palavra literária desde seus primeiros anos, ainda quando sua avó lia histórias à ela. Sua proximidade com pessoas e principalmente familiares de diversas idades e gerações a inspiram na criação de suas histórias infantis e romances. Ana descreve como “vivências afetivas distintas”, porém realça que, em sua concepção, adultos e crianças são muito parecidos: “As crianças têm vontade de ser amadas e de ter amigos. Têm medo de ser abandonadas, medo do escuro, medo do desconhecido. Elas têm raiva e, depois têm culpa por sentirem isso, associam essa culpa com medo… Os adultos são um pouco diferentes na maneira como se manifestam. Mas acredito que o ser humano, intrinsecamente, é muito parecido um com o outro.”

A festa da Lua, seu livro lançado no ano passado, é mais um dos inspirados em alguém que ama: seu sobrinho-neto Caetano, a quem chama carinhosamente de Caê e que deu o nome ao personagem. Foi escrito de imediato, após uma gracinha dele na pandemia, como descreve a autora. Ele começou a reparar nas fases da Lua, levando Ana Maria Machado à criação de um personagem que se encanta e fantasia sobre o satélite.

O livro Ponto de Vista, que teve sua primeira publicação em 2005, terá seu relançamento e contará com novas ilustrações de Luciano Tasso. A coletânea Ana Maria Machado - Uma autora em perspectiva também será lançada. Neste último, suas obras, tanto as infantis quanto as voltadas ao público adulto, são analisadas e comentadas por especialistas de diversos lugares do mundo. “Eu tenho a sensação de brincar de Berlinda”, comenta a escritora sobre esta edição, mencionando a brincadeira de sua infância. Ambos os lançamentos são feitos pela Global, no estande da editora, na Bienal do Livro, no Distrito Anhembi, em São Paulo, no dia 15 de setembro.

Para além das publicações e sessão de autógrafos, Ana Maria Machado fará parte do estande Espaço Infâncias, em que terá interações com crianças de diversas idades e será entrevistada por elas. Isso não é novidade alguma para a autora, já que está acostumada com os pequenos desde o início de sua carreira, quando ainda escrevia contos para a revista Recreio e fazia visitas a escolas. Mas apesar do hábito, as crianças sempre a surpreendem. Em seu livro Rastros e Riscos ela conta sobre uma conversa que teve com um menino mexicano em que ele queria saber sua idade, e logo depois, sem discrição, a pergunta: “E como é que uma velha de 68 anos lá no Brasil sabe o que se passa dentro da cabeça de um menino de 10 anos no México?”. Apesar de seu espanto com a autenticidade do questionamento, Ana achou a pergunta maravilhosa, e isso a marcou muito.

Entre suas escrituras, compromissos de trabalho e leituras, Ana divide seu tempo de lazer com a natureza. No Rio de Janeiro, sua cidade natal, ela está rodeada por mata e praia, e aproveita a presença de pássaros em sua janela, pois gosta de deixar comida para eles, para fotografá-los. Entre todas as suas inspirações para criar novas histórias, o meio ambiente também causa entusiasmo, um exemplo disso é seu livro Gente, Bicho, Planta: O mundo me encanta, de 2009.

Caminhar também é um de seus refúgios da vida atarefada. Ela passeia pela orla da praia, parques, visita museus e está sempre pesquisando por novas exposições. A arte tem uma presença muito forte em sua vida, já que iniciou sua carreira na pintura e até hoje ela mantém o hábito de pintar quadros vez ou outra.

Ana Maria Machado compartilhou com o Estadão os filmes e séries que têm assistido. Ela lembra que antigamente gostava muito de ir ao cinema, mas que hoje acompanha o audiovisual pelos streamings.

“Nas últimas semanas eu tenho acompanhado a nova temporada de Outlander, que eu estava esperando há um tempão”, conta a autora. “Um Complô Contra a América também assisti um episódio por dia na última semana”.

Ela conta que gosta de obras que tenham um contexto histórico e um pensamento crítico. Os trabalhos dos atores também chamam muito sua atenção, ela admira Meryl Streep e Al Pacino, e se eles estão no elenco de algum filme, ela certamente irá assistir.

A autora compartilha também os livros que têm ocupado sua cabeceira ultimamente: “Eu acabei de ler Os Substitutos, de Bernardo Carvalho. E eu tenho lido e acompanhado muito as publicações de mulheres, como Os Grandes Carnívoros, de Adriana Lisboa e O Rugido da Onça, de Micheliny Verunschk.”

Entre outros de seus autores favoritos estão Jefferson Tenório, Eliana Alves da Cruz, Itamar Vieira Júnior e Ana Maria Gonçalves, autora do premiado Um defeito de cor.

A leitura que têm acompanhado Ana Maria Machado ultimamente é Imagens da Branquitude: A presença da ausência, de Lilia Schwarcz.

Seu ritmo de trabalho continua o mesmo de sempre, igual ao início de sua carreira. A autora nota que até tem trabalhado e se cansado mais, por conta da tecnologia e das diferentes ferramentas usadas para criar. O que deveria facilitar, para ela é algo que atrapalha um pouco. “A gente perde muito tempo respondendo e-mail”, menciona ela. “Eu ganho um tempo de não ter que ir à rua resolver algo, ou assinar um contrato, mas perco um tempo de escrever, porque eu estou na frente do computador fazendo um trabalho que não me acrescenta nada”.

Sempre que começa algum livro, ela pensa que será o último e que posteriormente irá se aposentar, mas Ana Maria Machado declara que não consegue viver sem trabalhar, e sabe que isso é consequência de se fazer o que ama.

“Não me vejo na iminência de me aposentar ou de parar de escrever. A não ser que eu não consiga mais, que eu tenha algum problema mental ou de saúde. Eu não tenho necessidade de parar, eu gosto de fazer o que faço”.

Ela menciona que, apesar da idade, das insônias e da dificuldade em organizar seu tempo, ainda escreve muito e idealiza projetos futuros.

Matéria na íntegra: https://www.estadao.com.br/cultura/literatura/como-uma-pergunta-ouvida-por-ana-maria-machado-de-sua-filha-ha-mais-de-40-anos-virou-seu-novo-livro/

 

16/09/2024