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O último marechal brasileiro

 

Mesmo em cadeira de rodas, como passou alguns dos seus últimos anos de vida, o Marechal Waldemar Levy Cardoso tinha uma característica marcante: o sorriso. Comparecia às principais solenidades do Exército, especialmente o “Dia do Soldado”, sempre vestido de forma elegante e cumprimentava os conhecidos e antigos subordinados de uma forma constante, demonstrando a alegria por estar vivendo aqueles momentos, o que aconteceu até chegar aos seus incríveis 108 anos de vida, com inteira lucidez.


Tive o privilégio de ser apresentado a ele por um dos seus bisnetos, o empresário Eduardo Levy. Foi uma conversa agradável, que logo se voltou para as incidências da II Guerra Mundial, em que ele comandou o 1º Grupo de Artilharia da gloriosa Força Expedicionária Brasileira (FEB). As operações na Itália, sobretudo no inverno, não eram nada fáceis. As tropas nazistas estavam estrategicamente encasteladas em posições privilegiadas, o que acabou causando a morte de mais de 400 dos nossos pracinhas.


O Marechal Waldemar Levy Cardoso, que recebeu essa promoção em 1966, elogiou a coragem dos soldados brasileiros e o seu espírito de luta. Na guerra, teve atuação decisiva nas principais batalhas enfrentadas pelos nossos pracinhas, como foram as tomadas de Monte Castelo, Montese e Castelnuovo. Sempre foi muito elogiado pelo seu espírito estratégico. Para dar o exemplo, numa das batalhas, ele pessoalmente foi à frente e acabou cercado numa posição de extremo perigo. Sentiu a morte de perto. Então se lembrou de uma pequena medalha que havia recebido da esposa, católica fervorosa, na hora da despedida, com a recomendação explícita:- Se você estiver em perigo, lembre-se de mim. Aperte bem essa medalha e Deus o protegerá.


Foi o que ele fez e aconteceu um aparente milagre. As forças nazistas bateram em retirada, sem explicação plausível. O marechal atribuiu a sua salvação a uma providencial ajuda da santa, cuja medalha ele nunca mais tirou do colar que trazia ao pescoço.


Assim se explica a sua conversão do judaísmo de origem (a família Cardoso, sefaradita, veio da Península Ibérica) para o catolicismo.O seu pai era português e a mãe, argelina. Ele sempre permaneceu fiel aos valores mais caros da religião do “povo eleito”.


Na carreira militar foram 48 anos de serviço ativo, participando do levante tenentista de 1924, da revolução de 30, da repressão à Intentona Comunista de 1935. Foi adido militar do Brasil na França e na Espanha. Escolhido para a presidência do Conselho Nacional do Petróleo, em 1969 tornou-se presidente da Petrobrás, destacando-se pela linha de sadio nacionalismo com que atuou naquela que hoje é a segunda empresa petrolífera do mundo. De 1971 a 1985, foi conselheiro da empresa, colaborando para o seu notável crescimento.


O título de marechal foi o último concedido pelo Exército, que o reservou apenas para tempos de guerra. Com o seu reconhecido espírito de brasilidade, Waldemar Levy Cardoso deixou-nos, convencido de que a paz levará o país a caminhos seguros de desenvolvimento. “Pra isso lutamos”, costumava afirmar, no seu exemplar otimismo.


O Estado do Maranhão, 6/6/2009