O sucesso do PAC na multiplicidade de benefícios concretíssimos trazidos às populações mais desmunidas, torna-se o carro-chefe da nossa política de mudança. Só que corre o risco de ser visto como um adereço, ou um aditivo ao eixo único que é o do nosso desenvolvimento que ganha afinal a sua sustentabilidade. Não se pode assimilar, por exemplo, a uma rede de proteção social envolvendo na mesma teia a melhoria do salário mínimo, o avanço de seus benefícios intrínsecos e localizados, o bolsa-família, o seguro de desemprego ou a agricultura familiar.
Não há que desfiar esta litania, mas, sim, vê-la no bojo do que seja a conjugação decisiva entre econômico e o social no avanço da prosperidade brasileira. O atual governo saiu da preguiça redistribuitiva, na prioridade à superação da marginalidade social, incorporando ao país, nestes três anos, a população de uma Colômbia.
O Bolsa-Família gera seus próprios pólos de expansão de renda, de indução local de consumo e de emprego, em dinanismos díspares e imediatos, fora da velha visão funcional do acesso do trabalho numa economia de emprego. Nem se acuse o programa chave de melhoria social do governo de criar bolsões crescentes de previlegiados. O primeiro quadriênio já mostra que 20% dos seus contemplados já saíram, de fato, da faixa assistencialista. A iniciativa não só abriu espaço aos destituídos, mas, de vez, encontrou formas de mobilidade induzida, numa economia de consumo, fora do consumismo e dentro de uma nova dinâmica do orçamento doméstico.
O sucesso do Ministério Patrus não é o de uma legítima mecânica de desenvolvimento, brotada desse trabalho direto sobre a anomia coletiva, no desentranhar desta nova mobilidade, que se beneficia diretamente do serviço de educação ou saude e, de vez, rompe com toda reacomodação à inércia coletiva.
Falta-nos ainda estudo para verificar até onde este aguilhão novo dos bolseiros leva-os a um associativismo distinto do sindicalismo clássico. E é também o que hoje cria este "povo de Lula", identificado ao Presidente à margem do PT, ou de todas as formas de mediação em que ainda em 2002 se imaginava o sucesso do governo diferente. Mais grave ainda, entretando, é que esta dicotomia entre proteção e mudança engana a originalidade do novo modelo econômico brasileiro e, nele, da intervenção crescente do Estado na garantia da sustentabilidade da nossa mudança.
As políticas de investimento público deixam o nosso modelo a anos luz do pudor estritamente regulatório, remate das receitas tucanas. Mas um neotriunfalismo açodado diante da crise internacional não se dá conta do peso que o neoestatismo brasileiro garantiu à poupança pública e privada, ao contrário do que auguraria o modelo capitalista ortodoxo do país.
Na velha visão mimética da dependência, as crises seriam o álibi natural para a prudência e o escolhimento do empenho produtivo. Vamos, sim, à outra vertente, no que está aí o PAC de todo dia, no sabermos o que nos cumpre, entre o medo do risco e a confiança da mudança.
Jornal do Commercio (RJ), 5/6/2009