Eram muitos, estavam em todas as partes, usavam uma farda meio esculhambada, um quepe maior do que a cabeça, pareciam carteiros fatigados e tristes, levando uma bandeirinha amarela e uma espécie de regador com creolina para desinfetar possíveis focos de mosquitos. Para os editoriais da grande imprensa, eram “os valorosos soldados de Oswaldo Cruz”. No dia a dia e no dia-a-dia das ruas e das gentes, eram os mata-mosquitos – com hífen ou sem hífen, dava no mesmo.
Colocavam a bandeirinha amarela na grade da casa que visitavam, tinham direito a vasculhar tudo, depois colavam um certificado, também amarelo, num canto qualquer, atestando a visita mensal da saúde pública.
Não sei por que, tinha medo deles. O pior que podia me acontecer era ser um mata-mosquito quando crescesse – se é que um dia eu cresceria. Por duas ou três vezes, fixei meu pai na cadeira de balanço, imaginando como ele seria se, em vez de jornalista, fosse mata-mosquito. Intrigado, perguntou-me o que estava havendo, se havia alguma coisa de errado com ele. Disfarcei, disse qualquer coisa, mas voltei a pensar naquela sinistra hipótese – e tinha razão para isso.
Por força das circunstâncias, ou por qualquer outra maldição do destino, acabei seguindo a profissão do pai, que era obscuro jornalista de O Paiz e, mais tarde, do Jornal do Brasil, onde, mais tarde, comecei minha faina profissional
Preguiçoso a ponto de não esperar um futuro decente para mim, tenho a certeza de que, se ele fosse mata-mosquito, eu também o seria, dando sequência a uma dinastia honrada, embora modesta. Volta e meia, ainda acordo no meio da noite, fatigado e triste, levando minha bandeirinha inútil, sem nada ter a fazer com ela, matando os mosquitos da memória e da saudade.
Folha de S. Paulo (RJ), 23/4/2009