De olho em recursos de 8 bilhões de reais, pertencentes ao Sistema S, especialmente Senac e Senai, o Ministro da Educação sonhou em se apropriar dessa verba anual para ampliar as vagas gratuitas de educação profissional. O motivo era nobre, mas para que ele se viabilizasse necessário seria produzir uma lei congressual, coisa para dois anos de idas e vindas, com todos os riscos de enxertos indesejáveis. Seria uma situação de desconforto para o Governo Lula.
Houve conversações, no começo com fortes atritos, mas a sabedoria prevaleceu e estabeleceu-se um acordo, com honra para todas as partes. Da receita líquida do Sistema S, a partir de 2009 e até 2014, de forma progressiva, serão destinados recursos ao programa de expansão de vagas, praticamente em todo o território brasileiro. O bom senso prevaleceu, na discussão entre autoridades e empresários. O Sesc e o Sesi também participarão da parceria, oferecendo atividades sociais e culturais de primeira qualidade, como é da sua tradição, nas várias sedes que há no país. Chegarão a 2014 investindo 1/3 dos seus respectivos orçamentos para viabilizar esse louvável acesso, sobretudo para crianças carentes.
Um bom acordo sempre é melhor do que qualquer tipo de briga e um dos itens aprovados refere-se ao respeito à autonomia do Sistema S, na gestão dos recursos. Surgiram insinuações estatizantes de que havia descuidos nessa operação, o que irritou as confederações patronais, submetidas ao rigor de auditorias permanentes e à ação, sempre vigilante, do Tribunal de Contas da União. O que ganha a educação brasileira com tudo isso? Um projeto de revalorização do ensino técnico, a ampliação das oportunidades de profissionalizantes gratuitos e educação básica e continuada, além de ações educativas gratuitas, o que se faz hoje de forma descompassada nas várias regiões em que se posiciona a diversidade brasileira.
A idéia é boa, produto de uma compreensão saudável, mas há nuvens que podem toldar a sua eficiente execução. Falta um decreto presidencial para pormenorizar de que forma isso tudo será feito. E mais: com o atual quadro de confusão que marca o ensino médio, que teve origem no Governo FHC, fica difícil esperar sucesso imediato na relação custo/benefício. É preciso pensar em questões essenciais, como o aperfeiçoamento da Lei no 9394/96 (já envelhecida) no que se refere ao ensino profissionalizante, cujo currículo é indesculpavelmente complicado.
Outro problema que essa discussão suscita é o respeito às vocações econômicas do país. Se querem em Brasília baixar ordens para serem cumpridas, do ponto de vista curricular, em Rondônia ou no Rio Grande do Sul, mantendo a lamentável tendência da centralização ditatorial, comete-se um equívoco de proporções titânicas. Vamos ouvir mais e melhor os sistemas estaduais, colaborando o governo central com recursos para que sejam feitos levantamentos sérios a respeito do crescimento regional. Se existe uma vocação agrícola, não há porque promover cursos no setor secundário da economia. Pesquisas mostram que ainda temos uma incômoda proporção de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos de idade. Até que ponto a formação precária atrapalha a absorção desse enorme contingente?
Interessante no quadro que se delineia é a preocupação cultural. Não será apenas o ensino gratuito, mas a concessão, por intermédio de bolsas parciais, de subvenção a projetos relacionados à saúde, ao esporte e ao lazer, além da cultura propriamente dita, como faz o Sesc, com enorme sucesso, nas múltiplas unidades existentes no Brasil. As exposições, como as que são feitas hoje em Pinheiros e Santo André (São Paulo), que tivemos o ensejo de visitar, merecem ser vistas por jovens e crianças. O tema é o livro como instrumento de cultura. Isso não interessa também a alunos e trabalhadores de baixa renda?
Jornal do Commercio (RJ) 8/8/2008