Para quem vive no Brasil, a criança triste está longe de ser um personagem desconhecido. É aquele menino ou aquela menina que vemos vagando pelas ruas ou pedindo esmola nos cruzamentos, a criança que não sorri porque não tem do que sorrir. É a tristeza que resulta da pobreza e que, mesmo não aceitando (e não deveríamos mesmo aceitar), podemos compreender.
Mas há um outro tipo de tristeza infantil. Aí trata-se de uma criança de classe média ou classe alta, que tem uma vida confortável, uma criança a quem não faltam roupas, brinquedos, livros, videogames. Uma criança que pode freqüentar as melhores escolas, que pode viajar com os pais. De repente, essas crianças mostram-se chorosas, perdem interesse em brincadeiras e atividades, começam a ir mal na escola (ou não querem ir à escola), recusam alimento, dormem mal, queixam-se de dores vagas.
Uma criança assim pode estar deprimida. O que certamente causa surpresa: depressão na infância? Na aurora da vida, para usar a expressão de Casemiro de Abreu, naquela fase em que o sol da alegria deveria brilhar radioso?
Pois é. Esse sol pára de brilhar, transforma-se no "sol negro", que dá título ao livro de Julia Kristeva sobre melancolia e depressão. Pois é disso que se trata, de depressão. Sim, crianças podem ficar deprimidas. Acontece com 5% delas, segundo pesquisas do Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos. E é uma possibilidade na qual os pais deveriam pensar, inclusive por causa do risco, ainda que pequeno, de suicídio.
Mas é, felizmente, uma situação tratável. Hoje, temos recursos de eficácia comprovada na depressão. Em primeiro lugar, a terapia, da qual existem várias formas. Por exemplo, a terapia cognitiva, que não tem a profundidade da análise, mas visa a obter resultados em tempo mais curto. E temos os medicamentos, sobretudo os que aumentam a serotonina, aquele "energizante cerebral". Destes, o mais conhecido é a fluoxetina (Prozac). A melhor conduta, segundo um estudo do mencionado Instituto Nacional de Saúde Mental é combinar as duas coisas. Aí a porcentagem de êxito chega a 71% (só com fluoxetina, essa porcentagem é de 61%, e só com psicoterapia, de 43%). Seja na psicoterapia ou na terapia medicamentosa, uma regra é básica: ambas devem ser feitas por pessoas com experiência na área, porque todo tratamento tem páraefeitos.
As crianças e os jovens têm direito à aurora da vida. E os pais precisam estar atentos e disponíveis para fazer com que isto aconteça.
Zero Hora (RS) 2/8/2008