RIO DE JANEIRO - Perdoem a insistência: mas na recente embrulhada policial-jurídica, envolvendo duas importantes instituições do Estado (Executivo e Judiciário), o que mais me espantou foi a certeza de Daniel Dantas ao se declarar "tranqüilo" quanto ao Supremo Tribunal Federal, do qual nada temeria.
Para amaciar a pressão do Executivo, exercida pela Polícia Federal, o banqueiro usaria o recurso banal do suborno, seria uma questão de preço. Deu azar. A autoridade em questão botou a boca no trombone, fornecendo o motivo legal para a segunda prisão de Dantas, comprovadamente interessado em prejudicar as investigações.
Até aí, tudo nos conformes do cão e do gato, polícia contra crime ou crime contra polícia. O assombro ficou por conta da confiança que Dantas demonstrou em relação ao Supremo -confiança que foi confirmada com o habeas corpus concedido a ele e a seu grupo pelo ministro Gilmar Mendes.
Não é conhecida a sapiência do banqueiro em questões jurídicas que poderiam dar apoio à sua tranqüilidade. Ao contrário da tentativa com o delegado da PF, a intenção de subornar a mais alta corte de Justiça do país seria uma alucinação, manifestação patológica que não se espera de um executivo do porte de Dantas.
Para se entender a tranqüilidade do banqueiro é preciso relembrar atos e fatos do passado, notadamente do governo de FHC, quando duas questões, entre outras, deixaram buracos negros na acidentada sucessão de escândalos de nossa vida pública. As privatizações, de um lado, e a compra de votos para o segundo mandato de FHC foram abafadas pela presteza da Advocacia-Geral da União. À margem disso tudo, o dinheiro que lubrificou o mensalão, escândalo até agora inconcluso, já em tempos do PT.
Folha de S. Paulo (SP) 13/7/2008