RIO DE JANEIRO - Comecei 1968 em Cuba e terminei-o numa cela do Batalhão de Guardas, ao lado de Joel Silveira, onde estávamos presos desde 13 de dezembro, dia do AI-5. Em Havana não houve maio de 68, nem na ilha de Pinos, onde ajudei a plantar sementes para a produção de café que Fidel Castro garantia que seria maior do que a do Brasil.
Sentindo-me desconfortado com a ditadura cubana -apesar de reconhecer suas conquistas na educação e na saúde-, voltei para o Brasil sabendo que seria preso no aeroporto, como de fato fui, mas por apenas uns dias.
Na ida para Havana, fizera escala em Praga, vi o enorme busto de Stálin, na praça Venceslau, derrubado de seu pedestal no início do movimento que estouraria na primavera do ano seguinte e que foi sufocada pelos tanques soviéticos. Na volta, refiz o itinerário e vi o busto recolocado no mesmo pedestal, guardado por soldados do novo governo.
Os temas em discussão eram a Guerra do Vienã, a recente morte de Guevara e a possibilidade de nova invasão na baía dos Porcos por mercenários treinados pela CIA. No mais, cantava-se "Guantanamera" nas ruas e via-se "A Batalha de Argel", de Giles Pontecorvo, nos cinemas.
Os movimentos estudantis daquele ano foram a confluência de vários problemas. Na Alemanha, revolta contra a truculência no ensino, da qual Heinrich Mann fez o retrato que foi filmado com o título de "O Anjo Azul" (no original, "Professor Unrat").
Na França, a juventude sentiu que acabara "la grandeur", a França "éternelle", enfim, "les jours de gloire" do hino local. Os jovens perceberam que a cultura tradicional não seria mais deles. Num filme de Jacques Tati, o dono de uma mercearia retira o cartaz de uma pilha de "fromages" e coloca outro com a indicação: "cheese".
Folha de S. Paulo (SP) 20/5/2008