A base de tudo é o conhecimento, e a base do conhecimento é a educação. É por isto que, no Brasil de hoje, precisamos repetir o lema com o qual o líder chinês dos anos 80 do século passado, Deng Chiao-Ping, definiu como programa dos quinze anos seguintes de seu governo: educação, educação, educação. Com esse programa Deng Chiao-Ping transformou um país cheio de problemas de então na potência que a China é hoje.
No Brasil, quem assumiu a vanguarda, há já algum tempo, dessa campanha indispensável, foi Arnaldo Niskier, sobre quem sai agora uma biografia de José Louzeiro, Luzes da consagração, que narra a luta que o antigo menino dos Pilares empreendeu nos últimos decênios em prol de uma política de educação que transformasse este país grande num grande país.
Depois de uma infância em subúrbio pobre e de uma dedicação permanente ao estudo, já aos 33 anos era Secretário de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro e, em seguida, Secretário de Educação e Cultura: estava inteiramente integrado na luta que vem até hoje. No discurso com que o recebeu na Academia Brasileira de Letras, chamou Rachel de Queiroz a atenção para os vinte e oito livros que Arnaldo publicara até então. Estas foram suas palavras: “Todos os vossos livros contêm análises, diretivas, programas, visando ao aperfeiçoamento da educação brasileira”.
A história de Arnaldo Niskier e de sua família, bem como a história geral de uma concepção do mundo, na linha que nos vem de Abraão e da Bíblia aparecem com evidência no livro de José Louzeiro, junto com o relato das perseguições que seus descendentes sofreram em toda a parte. De tal modo ela se integra na existência do Brasil como país que o livro de Louzeiro acaba sendo também uma história do Brasil dos tempos do integralismo e de Getúlio Vargas, que foi quando nos aproximamos, em tempos recentes, de uma inaceitável e condenável política racial.
O livro faz um levantamento de todos os membros da família Niskier no Brasil, inclusive o do irmão mais velho, Odilon Niskier, que tem sua história própria, também como escritor que, sindicalista e membro do Partido Comunista Brasileiro, escreveu também sobre problemas nossos. Dele disse Davy Bogomelete: “Em toda geração existem 36 homens justos, graças aos quais o mundo sobrevive. Não fossem eles, Hitler teria vencido a guerra, a África seria de Idi-Amin, a América do Sul de Pinochet, ou seja, o mal estaria instalado no Mundo. E eu não tenho a menor dúvida de que Odilon Niskier, na geração dele, é um desses 36.”
O livro registra ainda a atitude de Aracy de Carvalho Guimarães Rosa, segunda mulher de Guimarães Rosa, e do próprio Rosa, salvando judeus que desejavam emigrar para o Brasil (o que havia sido proibido pelo governo Vargas). Rosa era cônsul-adjunto do Brasil em Hamburgo, Alemanha, e Aracy, com o apoio do marido, fornecia vistos para que os judeus perseguidos viessem morar no Brasil.
Ao terminar seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, usou Arnaldo Niskier as seguintes palavras de Alcântara Machado: “Só em minha terra, de minha terra, para minha terra, tenho vivido; e incapaz de serví-la quanto devo, prezo-me de amá-la quanto posso.”
O prefácio do acadêmico Murilo Melo Filho começa com a citação de John Kenneth Galbraith: “A história dos grandes homens começa, geralmente em crianças humildes”. E segue: “Pude escrever este prefácio porque José Louzeiro, o autor deste livro, teve a gentileza de submeter previamente os seus originais à minha apreciação. Deliciei-me com a sua leitura da primeira à última página. Já conhecia o biografado Arnaldo Niskier há mais de meio século, quando nos encontramos e nos unimos num afeto comum, nascido na velha oficina de Bloch Editores, onde a Revista Manchete dava, então, os seus primeiros passos. Os ancestrais de Arnaldo têm raízes profundas em Ostrowiec, na Polônia dos cruéis tempos que antecederam à Segunda Grande Guerra, com as implacáveis perseguições de Hitler ao bravo povo judeu, até o seu êxodo para o Brasil, que adotaram como a sua segunda Pátria.” Em sua apresentação Júlio Niskier ressalta: “Em seu uniforme branco, Arnaldo dava os primeiros passos na admirável caminhada pelos estudos que o levariam a destinos que nem em sonhos poderíamos supor”.
Luzes da consagração - Vida e obra do educador, escritor e acadêmico Arnaldo Niskier, de José Louzeiro, é uma edição Europa. Revisão de Carolina Rodrigues, capa e projeto gráfico de Isio Ghelman e fotos do acervo pessoal de Arnaldo Niskier. Orelhas de Jorge Amado, Josué Montello, José Sarney, R. Magalhães Jr., Nelson Rodrigues, almirante Álvaro Alberto e Carlos Heitor Cony.
Tribuna da Imprensa (RJ) 13/5/2008