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Réquiem para o Brasil em Oxford

 

Há dez anos, a Universidade de Oxford, uma das mais prestigiosas do mundo, criou um Centro de Estudos Brasileiros, independente dos tradicionais Centros de Estudos Latino-americanos, onde pesquisas sobre o país se diluem ao sabor de conjunturas.


Entregou a direção ao historiador Leslie Bethell, um amigo e conhecedor do Brasil, autor de um livro clássico sobre o fim do tráfico de escravos, organizador dos excelentes volumes sobre a história da América Latina, publicados pela Universidade de Cambridge, e, atualmente, membro estrangeiro da Academia Brasileira de Ciências.


Inaugurado em 1997, o Centro se tornou a única e mais produtiva instituição em todo o mundo universitário europeu e norte-americano a se dedicar exclusivamente ao estudo e à pesquisa sobre o Brasil.


A inauguração contou com a presença do presidente Fernando Henrique Cardoso, do embaixador Rubens Barbosa e do ministro Luiz F. Lampreia. Dois anos depois, o Centro recebeu a visita de Luís Inácio Lula da Silva e, mais tarde, do senador Eduardo Suplicy, do atual ministro Tarso Genro e de outros políticos.


Em seus dez anos de vida, o Centro se afirmou como o mais importante núcleo de estudos sobre o Brasil fora do Brasil. Acolheu mais de cem pesquisadores, intelectuais e estudantes brasileiros.


Promoveu cerca de duzentas conferências semanais sobre temas brasileiros, pronunciadas por economistas, historiadores, cientistas sociais, escritores, ambientalistas, tanto brasileiros como estrangeiros.


Organizou dezenas de seminários internacionais em que se discutiram temas relativos à inserção e ao papel do Brasil na nova ordem internacional.


Ofereceu bolsas de pesquisa e espaço de trabalho para cerca de 40 bolsistas brasileiros.


Publicou livros e mais de oitenta artigos escritos por seus pesquisadores e visitantes.


Pode-se dizer com segurança que, durante 10 anos, Leslie Bethell e seu Centro foram os grandes embaixadores da cultura brasileira no Reino Unido, com repercussões em toda a Europa.


Ao ser fundado, e ao longo de dez anos, o Centro contou com a boa vontade e o apoio do governo e de empresas brasileiras, para não falar nos recursos oriundos de Oxford e de empresas e governo britânicos.


Apoiaram-no, entre outros, o MinC, o Itamaraty, o CNPq (com bolsas para pesquisadores), a Petrobras, as Organizações Globo, o Grupo Votorantim, o Banco Safra, a ABL (financiando uma cátedra Machado de Assis).


Neste mês de setembro, a Universidade de Oxford fechou o Centro, alegando dificuldade em obter recursos para o manter por mais um período de 5 anos. Os apoios sumiram, as contribuições secaram, sobretudo as do governo e de empresas brasileiras.


Em 2005, em visita oficial ao Reino Unido, o presidente Lula assinou convênio criando no Centro a cátedra Rio Branco de relações internacionais, mas a promessa não saiu do papel. Outros esforços de captação de recursos no Brasil e no Reino Unido não deram resultado. Dez anos de promoção da cultura, da ciência e dos interesses do Brasil parecem não contar para nada, e a iniciativa expira melancolicamente.


A sede da instituição já foi ocupada pelo Centro de Estudos Africanos. Os estudos do Brasil retornaram, amesquinhados, para o Centro de Estudos da América Latina.


A universidade decidiu aguardar até o fim do ano por eventuais aportes de recursos que permitam ressuscitar o Centro como órgão independente em 2008.


É desalentador verificar que um país em busca da voz que lhe cabe no cenário internacional, e que luta por sua admissão ao Conselho de Segurança da ONU, não disponha de algumas migalhas de seus recursos para manter viva uma ponta de lança cultural no coração da União Européia.


O Globo (RJ) 9/9/2007