Como estudiosos da língua portuguesa, tivemos oportunidade de colaborar para que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, elaborado por Antonio Houaiss, viesse a lume. A construção ocorreu em Bloch Editores. O mesmo aconteceu com o Dicionário da ABL, transformado depois em seis volumes coloridos, de alto luxo, tendo por base os 72 mil verbetes preparados por Antenor Nascentes.
Assim, vemos com uma certa ansiedade a sugestão de, em 2009, implantar finalmente o chamado “Novo Português”, fruto do Acordo Ortográfico de Unificação, proposto desde 1990 às nações lusófonas . O objetivo é dos mais nobres: aproximar a língua falada no Brasil com aquela que é praticada em Portugal, preservadas as fonéticas locais.
As condições legais para que isso ocorra foram criadas: pelo menos três países da nossa comunidade estão de acordo com a proposta de unificação, o que deveria obrigar os demais. Os primeiros signatários foram Brasil, Cabo Verde (sempre conosco) e Timor Leste. As resistências são encontradas sobretudo em Portugal, que foi e voltou diversas vezes. Talvez por pressão dos editores locais, que não querem pensar em recompor os seus livros, com a dita nova ortografia.
As diferenças nem são assim tão expressivas: 0,5% de mudanças no Brasil e 1,6% em Portugal. Convém recordar que, isso feito, deixaríamos de grafar úmido no Brasil e húmido em Portugal, o fato brasileiro conviveria com o facto, na nação amiga. O trema seria praticamente extinto e haveria a diminuição de hífens, como na palavra mandachuva.
Aliás, sobre o trema convém lembrar que há jornais da mais alta credibilidade, como é o caso da Folha de São Paulo, que já não usam o sinal referido, por desnecessário. Não se trata de um caso de desobediência civil, mas a busca de um sentido mais prático para o uso da língua de Machado de Assis.
O alfabeto, atualmente com 23 letras, ficará enriquecido de mais três: k, y, w. Será admitida dupla grafia em algumas palavras, como cômodo e cómodo, Antônio e António, gênio e génio, sendo sempre a primeira forma a que se diz em nosso país.
Com bom humor será possível afirmar, a partir da entrada em vigor das normas aprovadas, que “estamos tranquilos, pois o Antônio se entenderá com o mandachuva.” Antes, no Brasil, seria “estamos tranqüilos, pois o Antonio se entenderá com o manda-chuva.” São sutis as diferenças a serem consideradas.
Mas há resistências a serem vencidas. Embora exista uma data no horizonte, que seria janeiro de 2009, pode ser que, na melhor das hipóteses, seja necessário dar mais dois anos para a sua efetiva implementação. Isso está previsto no Acordo, que poderá trazer mais prestígio internacional à língua portuguesa, até facilitando a sua entrada oficial na Organização das Nações Unidas, ao lado de outras línguas de cultura, como é o caso do inglês, do francês e do espanhol. Quando se decidir de vez a data, seria preciso dar um prazo para a adaptação de livros e obras de referência, mas isso, com os recursos da computação, não chega a ser muito complicado.
Jornal do Commercio (RJ) 14/9/2007