Quem chama nossa atenção para os escritos do Desembargador Siro Darlan é o Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal. “Você não pode deixar de ver o artigo em que ele aborda a fabricação de bandidos.” De início assustados, depois foi possível entender a que se propunha o bravo defensor das crianças brasileiras, desde os tempos em que dirigiu o Juizado de Menores do Rio de Janeiro.
Suas palavras são candentes:
“Se quiser fabricar um bandido, entre outras coisas, ensine a criança desde cedo que ela não é amada, que é rejeitada pela própria mãe. Espanque-a pelo menos três vezes ao dia, para que ela saiba que tudo na vida tem de ser tratado com muita violência. Impeça qualquer possibilidade de crescer sadia, pois esse fato estragará todo o seu projeto. Importante: repita sempre para essa criança que ela é má, coisa ruim e odiada pela família, principalmente porque chegou para dividir o pequeno espaço que os abriga e a escassa alimentação.”
O Dr. Siro vai além, abordando a questão da escola:
“Procure discriminá-la e desestimular o seu estudo, reprovando-a sempre.”
E segue na sua ironia, pedindo que se coloque a criança desde cedo no trabalho; que a educação pública seja ainda de pior qualidade e que ninguém avance na idéia maluca de construir mais escola; que haja uma bela campanha publicitária para mostrar que essa criança é o nosso inimigo público número um; e que todos permaneçam à margem do Estatuto da Criança e do Adolescente.
É claro que o artigo do Dr. Siro Darlan foi feito para chocar a consciência dos brasileiros. Enquanto a corrupção campeia solta, quase ninguém é preso por delitos ostensivos e o acesso às drogas é cada vez maior, como se poderá desejar uma sociedade em que a criança seja devidamente respeitada?
Assim são criados os “monstros” com os quais devemos conviver, como se não houvesse outro destino a nos esperar ou outra alternativa para o nosso país. Quanto amargor há-de ter enfrentado, nas suas atividades, o ilustre e combativo magistrado?
Não queremos que este seja o nosso futuro. Deseja-se exatamente o contrário, como faz jus a nossa geração, por sua imensa maioria. Assistir a esse espetáculo de desídia em relação à criança, sem uma atitude severa de reação, cruzando os braços, como é mais cômodo, poderá transformar muito desse patriótico sarcasmo em realidade. Não é o melhor para o Brasil, nem a sua única alternativa.
Há tempo de reagir. Não pelo esforço ou o aconselhamento de uma só pessoa ou de um pequeno grupo de idealistas. Mas a nação como um todo, para que o movimento seja forte, coordenado, produza resultados. Nossas crianças não são monstros, nem queremos que elas neles se transformem. A hora é de colocar a educação, pelos pais e pelas escolas, na sua posição de principal prioridade brasileira. É isso que verdadeiramente falta.
Jornal do Commercio (RJ) 29/6/2007