Ludovico dos Santos viveu, até aos 30 anos, sem dar importância ao nome. Nem ao azar: tudo de ruim lhe acontecia, sufocações na primeira infância, erisipela na mocidade, mau hálito permanente, falta de dinheiro crônica, feiúra quase absoluta e absoluta burrice para aprender qualquer coisa, com exceção da nobre arte de sobreviver a tantas e tamanhas dificuldades. Aos 31 anos, descobriu que o nome (Ludovico) talvez fosse o culpado de tudo. E decidiu mudá-lo, avisando a seus inimigos (não tinha amigos) e credores (mas tinha dívidas) que, a partir de tal dia e tal hora, ele mudaria de nome e só atenderia aos que o chamassem de Castelar. Ninguém reclamou. Mas por que não adotava nome mais simples como Jorge, ou para ficar na letra "ele", Luiz? Uma semana depois de ter adotado o nome de Castelar, ele arranjou uma namorada que gostou exatamente de seu nome. Era uma professora primária, passada na vida e nas amarguras, fora casada com um despachante aduaneiro, abortara três vezes, parira outras tantas, e aos 36 anos começara a sofrer de furor uterino. Castelar apaixonou-se por ela e vice-versa. Tiveram um filho que justo se chamou Vice-Versa. Castelar chegou a prosperar na profissão, pois não tinha profissão alguma e com a mulher trabalhando por ele sobrava-lhe mais tempo para nada fazer. Um dia, Castelar encontrou a mulher com um cara chamado Ludovico. Usava argolas nas orelhas, pintava o corpo com uma resina vermelha, era cabeludo e tocava flauta. Ela se apaixonou por Ludovico - e Castelar descobriu que o culpado de suas desditas não era o Ludovico, nome que portara durante tantos anos. Decidiu mudar de nome outra vez, mas já se habituara com o Castelar. Em dúvida, ficou com os dois, ou seja, com o Castelar e o Ludovico.
Jornal do Commercio (RJ) 27/11/2006