A busca de apoios para o segundo turno vem demonstrando que a ética (uma expressão-bonde que comporta diversas variantes) está sendo a tônica dos candidatos que fizeram da moralidade o diferencial de suas campanhas. Temos o caso da Denise Frossard, que desaprova seu candidato inicial (Alckmin) por causa do apoio de Garotinho, um apoio que não pode ser recusado.
O cenário ético montado após os escândalos do PT demonizou diversos personagens de nossa vida pública. No limite, o candidato ético, ou pretensamente ético, deveria pedir folha corrida e atestado de bons antecedentes a todos os eleitores que o apóiam. Razão de sobra teve FHC ao perguntar se Lula recusaria o apoio de Collor.
A ética tem uma prima pobre que se chama hipocrisia. Por fora, a bela viola repudia o pão bolorento. Proclama-se em altos brados o desprezo pelo apoio da "perdutta gente" que habita o inferno criado por Dante. Nos bastidores, sabemos que há uma briga de foice pelos apoios, que, no fundo, voto é voto, sejam eles imaculados, como pretende a Denise Frossard, ou maculados pelas denúncias e suspeitas que cercam determinados personagens da vida pública nacional.
Lembro uma frase de Churchill durante a Segunda Guerra Mundial: "Se o demônio for contra Hitler, eu me aliarei ao demônio". Era fácil então localizar o mal absoluto num único personagem. Em tempos de paz, a classificação de bom e de mau fica embaralhada, e cada lado tem o direito de escolher o seu demônio particular.
Tenho um amigo mineiro que jogou fora a sua estrela do PT que usava na lapela ao saber que Lula se uniria a Newton Cardoso, outro satanizado da política nacional.
Não faltam demônios e há anjos demais para todos os gostos.
Folha de São Paulo (São Paulo) 08/10/2006