Peruana finge ser homem e fica em prisão masculina na Argentina. Carla Aguilar, imigrante ilegal, foi presa por agentes argentinos. Ela disse que era homem e as autoridades acreditaram. O mais curioso é que Carla passou por vários exames e nenhum funcionário descobriu seu sexo verdadeiro, até que, um mês depois, uma ligação anônima alertou a Procuradoria Penitenciária. Folha Online, 5 de dezembro de 2005
A verdade é que não lhe foi difícil passar por homem. Tinha cabelo curto, feições enérgicas, uma voz grave, seios pequenos. Além disso, tinha o cuidado de colocar dentro da calça justa um pano, de modo a formar uma saliência que passava por respeitável genitália. Todas as manhãs fazia a barba, ou fingia fazer a barba. Os poucos detentos que se aproximavam, movidos pela curiosidade ou por outra intenção qualquer, eram prontamente repelidos: exímia lutadora de caratê, sabia aplicar golpes demolidores. Passou a ser temida e respeitada.
Mas não queria só ser temida e respeitada. Queria fazer amizades. Queria namorar. Namorar, sim. Apesar da aparência, era uma fêmea insaciável. E agora ali estava, no meio de tantos homens, vários dos quais bonitos -mas a eles não se poderia entregar.
Havia um rapaz que a atraía particularmente. Chamava-se Celso, era esbelto, elegante, com feições delicadas. Um tipo feminino, quase. O que, para ele, era um problema. Outros assediavam-no constantemente e a eles o pobre Celso, tipo franzino, não poderia resistir.
Quem o salvava era ela, a mulher que passava por homem. Depois de surrar sem piedade três ou quatro atrevidos, espalhou-se na prisão a notícia de que Celso lhe pertencia. E, de fato, desenvolveu-se entre os dois uma forte amizade, tão forte que, a certa altura, ela resolveu contar-lhe o segredo que tinha guardado tão cuidadosamente. Fez isso num dia em que ambos arrumavam o almoxarifado da prisão. Ali estavam, sozinhos, e certamente não seriam importunados. Não era o melhor cenário para uma declaração de amor, mas era o cenário possível. Sou mulher, ela disse, amo você, quero ser sua.
A reação dele foi extraordinária. Arregalou os olhos, apavorado, e antes que ela pudesse fazer alguma coisa, antes que tirasse a roupa, como pretendia, ele fugiu dali. Obviamente não acreditara na confissão. Obviamente acha que seria violentado, como o fora mais de uma vez.
No dia seguinte Celso foi, graças a uma ordem judicial, libertado. Da janelinha de sua cela ela o viu sair, feliz, abraçado à sua namorada de muitos anos. Quase derramou sentidas lágrimas. Só não o fez porque homem não chora. Sobretudo na prisão.
Folha de São Paulo (São Paulo) 12/12/2005