Deus é testemunha de que procuro ter o máximo de boa vontade (a possível, é evidente) para com os reclamos e sugestões, certamente importantes e justas, daqueles que, de um modo ou de outro, desejam uma opinião ou um comentário do cronista.
É com espanto que recebo esse tipo de mensagem. Minha própria opinião muitas vezes nem a mim interessa, tenho-a por obrigação profissional e, às vezes, nem isso, apenas para ter alguma coisa. Outro dia, viajando num avião, me perguntaram se eu não sentia alguma coisa de errado com um dos motores. Por Júpiter! Eu não sentira nada, mas passei a sentir e, na dúvida, invoquei santo Antônio e o anjo de guarda que insiste em me proteger.
Já tive vontade de escrever um conto sobre um sujeito que andava pelas ruas perguntando quantos caroços tem uma melancia. Talvez o escreva um dia, desde que tenha um ponto de partida confiável. Não se tratava de um louco nem de um desocupado. Era um botânico.
Tudo isso vem (ou não vem) a propósito de um e-mail em que me pedem a opinião sobre as eleições na Bolívia. Novamente: por Júpiter! Mal e porcamente me preocupo com as eleições que teremos no ano que vem e, embora não tenha interesse pessoal no caso, de alguma forma estou em jogo. E certeza só tenho uma: não votarei em ninguém, nem em mim mesmo -e nem mesmo se o clamor público exigir que eu salve o país e liberte o meu povo.
Agora, perder sono e tempo pensando no que vai acontecer na Bolívia, desde que não seja um daqueles terremotos letais, seria dose, ou areia demais para o meu caminhão -parece que estou usando uma metáfora já fora de uso.
Deus também é testemunha de que desejo tudo de bom para a Bolívia, prometo recomendá-la em minhas preces ao Todo-Poderoso, que não me tem atendido quando faço o mesmo em relação ao Brasil. Pensando bem, acho melhor não fazer nada, nem orar nem ter opinião.
Folha de São Paulo (São Paulo) 21/12/2005