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Orgasmos múltiplos

 

Já foi dito por gente mais autorizada do que o cronista que aliás não tem autoridade alguma: no Brasil, a campanha eleitoral começa no dia seguinte ao da posse do novo presidente. Em outros países também deve ser assim mas tendemos ao exagero e ao assanhamento. Noel Rosa diria: coisas nossas.


Antes mesmo das crises de corrupção que bagunçaram o coreto do PT e de Lula, o conselho dado e a ordem emanada dos estrategistas e demais interessados do governo podiam ser resumidas na advertência: não devemos antecipar a sucessão presidencial.


O conselho e a ordem não foram obedecidos por ninguém, a começar pelo presidente de República, que está em campanha pela reeleição desde que tomou posse.


Falei em conselho e em ordem. O conselho está sendo dado aos adversários, a ordem aos próprios integrantes do governo, que não se cansam de condenar a antecipação da campanha e todos de uma forma ou outra já estão nela até o pescoço para tentarem um governo estadual, uma cadeira no senado ou, na mais amena das hipóteses, ficarem no cargo até janeiro de 2007. Todo agente ensinou Aristóteles age por causa do fim, "agit propter finem".


"Não vamos antecipar a campanha" é aquilo que os advogados chamam de "fulcro" de qualquer pronunciamento presidencial, seja para inaugurar um simpósio sobre qualquer coisa, seja mesmo por causa nenhuma, quando as perguntas que lhe fazem são inocentes, a propósito de Ronaldinho Gaúcho ou das eleições bolivianas.


Quem conhece o presidente por dentro e por fora, seus amigos mais íntimos e fieis que por isso mesmo pediram o boné e foram embora sabem como Lula gosta de campanha, de deslocamentos aéreos, terrestres e marítimos. Basta-lhe a movimentação corporal para lhe dar um apetite colossal. Entrar numa campanha com as vantagens de que agora dispõe é também a antecipação de orgasmos múltiplos.


 


Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 26/12/2005

Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), 26/12/2005