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Um pouco sobre a nutrição

 

Chegar a Deus pela comida


DISCÍPULO E MESTRE IAM PELO campo certa manhã, e o discípulo pedia uma dieta necessária para a purificação. Por mais que o mestre insistisse que todo alimento é sagrado, o discípulo não queria acreditar.


“Deve existir uma comida que nos aproxima de Deus”, insistia.


“Bem, talvez você tenha razão. Aqueles cogumelos ali, por exemplo”, disse o mestre.


O discípulo animou-se, pensando que os cogumelos lhe trariam purificação e êxtase. Mas deu um grito ao chegar perto:


“São venenosos! Se eu comer algum deles, morro na hora!”


“Exceto esta maneira rápida de se aproximar de Deus pela alimentação, não conheço mais nenhuma”, respondeu o mestre.


O mendigo com fome


Um monge meditava no deserto, quando um mendigo se aproximou:


“Preciso comer”, disse o mendigo.


“Vá até a cidade e peça aos outros”, disse o monge. “Estou tentando comunicar-me com os anjos.”


“Deus se colocou debaixo do homem, lavou seus pés, deu sua vida - e ninguém o reconheceu”, continuou o mendigo. “Aquele que diz amar a um Deus invisível, e esquece seu irmão visível, está mentindo.”


E o mendigo transformou-se num anjo. “Que pena, você quase conseguiu”, comentou antes de partir.


Gurdjeff e o dervixe


O famoso mago russo Gurdjeff, ainda jovem e em busca da sabedoria, foi visitar um dervixe conhecido por seus poderes mágicos. Para impressioná-lo, comia apenas vegetais.


Certa noite, o mestre quis saber por que tinha uma dieta tão rígida.


“Para manter limpo o meu corpo”.


O mestre riu, aconselhando-o imediatamente a parar com essa prática: se continuasse assim, terminaria como uma flor na estufa - muito pura, mas incapaz de resistir aos desafios das viagens e da vida.


Buda e o iogue


Durante uma viagem, Buda encontrou um iogue que jejuava há muito tempo.


“Queimo os erros do meu passado”, explicou o homem.


“E quantos erros já queimou?”


“Não tenho a menor idéia.”


“E quanto falta queimar?”, insistiu Buda.


“Não tenho a menor idéia.”


“Então é hora de acabar com isso e entender que se corrigem os erros com boas ações e não com penitência”, foi o comentário de Buda.


O asceta de Soria


Perto da cidade de Soria, na Espanha, existe uma antiga ermida encravada na rocha, onde há alguns anos vive um homem que abandonou tudo para dedicar-se à contemplação. Fui procurá-lo numa tarde deste outono. Me recebeu com toda hospitalidade possível. Depois de dividir um pedaço de pão, pediu que o acompanhasse até um riacho próximo, para colher alguns cogumelos comestíveis. No caminho, um jovem se aproximou.


“Santo homem”, disse o jovem, “tenho escutado dizer que, para atingir a iluminação, não devemos comer carne. É verdade?”.


“Aceita com alegria tudo o que a vida te oferece”, disse ele. “Não pecarás contra o espírito, mas tampouco blasfemarás contra a generosidade da terra.”




O Globo (Rio de Janeiro) 27/11/2005

O Globo (Rio de Janeiro), 27/11/2005