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As CPIs e Frank Sinatra

 

A piada talvez não seja nacional, mas é carioca, tipicamente carioca. Como alguns podem recordar, durante séculos, anunciava-se a vinda de Frank Sinatra ao Brasil. E ele nunca vinha. Era um punhal cravado no coração, um espinho no orgulho nacional.


Afinal, em fim de carreira, um dia ele veio. Foi recebido com o assanhamento que herdamos dos índios diante das caravelas que aqui chegavam. Pulamos e dançamos alguns dias, inchados de auto-estima: "ele está entre nós". O diabo é que Sinatra foi ficando. Duas semanas depois, um grupo estava tomando chope numa das calçadas de Ipanema e, de repente, alguém avisou, aterrado: "Vamos dar o fora que ali vem o chato do Frank Sinatra!".


É mais ou menos o que está acontecendo com as CPIs que apuram os escândalos que tanto traumatizam a nação. Esperamos por elas, acreditamos que uma nova era se abria para o Brasil, um Brasil decente, responsável, livre de ladrões e de corruptos.


Mas tudo cansa, e o que não cansa balança. Já comentei aqui neste espaço que, em linhas gerais, elas se perderam nas investigações horizontais, sem buscar a verticalidade que levaria ao núcleo da crise que se instalou na vida pública nacional. Além do mais, os parlamentares que compõem as CPIs são advogados, empresários, cardiologistas, líderes sindicais, professores, nenhum deles tem conhecimento teórico e técnica especializada para a investigação. Nem equipamento.


Daí a sensação de que tudo, antes de terminar na suculenta pizza que está no forno, já cansou a plebe e só não cansou a mídia, porque ela, além de incansável por definição, vive de coisas assim. Os telefones não param, as informações em off, as fofocas, a cultura dos boatos, que são mais reveladores e devastadores do que os fatos, tudo alimenta os jornalistas ditos investigativos.


Nos botequins da vida, quando alguém puxa o assunto, há sempre um entediado que avisa, apavorado: "Lá vem aquele chato do Frank Sinatra!".




Folha de São Paulo (São Paulo) 04/09/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 04/09/2005