Que cada um de nós, individualmente ou em grupos indignados, éticos, escolha os seus vilões preferenciais. Numa lista apressada, atual e incompleta, aí vão alguns nomes: Delúbio, Severino, Marcos Valério, Zé Dirceu, Roberto Jefferson, Paulo Maluf e prole, Zé Genoino, Lula, os hierarcas do PT, o Duda Mendonça -e por aí vai, ao gosto ou desgosto de cada um.
Convoque-se o anjo exterminador, aquele cara com asas e espada flamejante que, de acordo com o Apocalipse, volta e meia vem à Terra em missão salvadora para extirpar o mal, degolar os corruptos e limpar a humanidade de indesejáveis. Pronto. Estaríamos salvos? Salvos uma ova!
O mal misturado àquela massa de barro de que fomos feitos não é tão fácil de ser distinguido e muito menos extirpado. A mídia, muito mais do que a opinião pública, declara-se chocada, estarrecida, pasma, enojada com a corrupção revelada pelos escândalos mais recentes. No entanto, apelando para a sovada imagem do iceberg, o que vemos é apenas um pedaço acima das águas.
A totalidade da montanha de gelo está submersa.
Costumo ler, todos os anos, Ernesto Hello, autor de um clássico, "A Fisionomia dos Santos": "O homem tem uma espantosa facilidade em errar. O erro entra nele por todas as aberturas que o põem em comunicação com o mundo exterior. Respira-o por todos os poros: coração, espírito, corpo -tudo nele é cruelmente, desoladamente corruptível".
Poderia ir mais longe, citando Schopenhauer, os céticos gregos, o Eclesiastes -que, na semana passada, citei por aí. Outro dia, em comentário na CBN a propósito de uma historiadora que datou a corrupção a partir de dom Pedro 1º, lembrei a fábula bíblica, anterior de muitos séculos ao Brasil, e de amplidão bem mais universal. Dois irmãos disputavam o poder de suceder o pai. Jacó comprou Esaú, pagando-lhe um prato de lentilhas, que, mesmo em moeda corrigida, devia valer menos do que qualquer mensalão.
Folha de São Paulo (São Paulo) 11/09/2005