Estamos vivendo os tempos da chamada "rodada do milênio", cuja maior característica é a eliminação de barreiras de toda sorte. No mundo da educação, complexo e fascinante, busca-se uma solução global, com a escola multicultural de que carecemos. O comércio eletrônico está na pauta de todas as negociações da Organização Mundial do Comércio, e por uma razão objetiva: representou um movimento de 300 bilhões de dólares na virada do século.
A mídia se beneficia desse avanço, que atinge naturalmente os segmentos sociais de que a educação é a expressão mais relevante. Se em 1991 havia 5 milhões de navegantes na internet, esse número se multiplicou muitas vezes, no alvorecer deste ano de 2002, sendo fácil imaginar a imensa repercussão desse fato na oferta de cursos virtuais, como os que começaram a ser oferecidos aqui no Rio de Janeiro.
O universo da mídia está sendo modificado - e para melhor, ouso proclamar. O que não impede a existência de absurdos, como o que se passou na França, onde dois livros foram censurados por tribunais de justiça, um dos quais (o de Toulon) ameaçando a editora, se não retirasse trechos da obra, com multas de até um milhão de dólares. Uma agressão ao sagrado princípio da liberdade de expressão - e logo no país que nos deu como lição a trilogia liberdade-igualdade-fraternidade.
Paralelamente, estamos vivendo o tempo da prevalência da televisão, com a sua estética da superficialidade, veículo barato e perigoso, na sua forma poderosa de tratar a percepção social ao seu modo. Quando uma rede oferece à população carente a assistência médico-odontológica de que o governo abriu mão, qual a nossa atitude mais correta? Felicitar a rede pela iniciativa ou criticar o governo? É o que a mídia teria de discutir, dentro da sua imensa responsabilidade social.
Os códigos da televisão, levando em conta o que ela pode fazer pela educação de massa, precisam ser desvendados em discussões verticais. Como aproveitar hoje a interatividade para a atenuação dos nossos dramas pedagógicos? A cultura de imagens que vamos adotando de forma acelerada não pode servir de pretexto para a derrubada da questão ética, prevalecente nas preocupações do filósofo francês Jean Baudrillard, que nos fala dos riscos da clonagem, analisando o contraponto do humano e do desumano, hoje aparentemente tão próximos. São elementos instigantes de um processo em constante ebulição.
A história da teleducação brasileira nasceu há muitos anos, numa época em que nem a mais fértil imaginação poderia prever os recursos hoje existentes. Quando se fala em educação interativa à distância, por exemplo, com emprego de satélites domésticos de telecomunicações, não se poderia supor que houvesse tamanha oferta mundial de teleconferências, reunindo universidades dos mais distantes rincões.
A interatividade significa debate em tempo real, o que antes seria impossível.
O professor Walter Garcia estima que, em dez anos, teremos cinco vezes mais alunos de educação à distância que os que se encontram hoje freqüentando cursos presenciais. Isso quer dizer que o Brasil terá, relativamente em pouco tempo, cerca de 10 milhões de alunos nos cursos à distância.
Veja-se o caso das universidades americanas, mesmo as mais tradicionais. É comum, hoje, a oferta de cursos à distância, com a utilização da expressão semipresencial. Os alunos recebem as suas unidades por intermédio do computador, na seqüência estabelecida pelos mestres competentes, com um pormenor verdadeiramente essencial: ninguém adquire o certificado de conclusão sem uma avaliação pessoal, ou seja, o aluno faz as suas provas de capacitação na universidade à qual está ligado o curso pretendido.
O crescimento do número de usuários da internet no mundo é impressionante: na proporção de 10% ao ano, são 60 milhões de pessoas hoje se entendendo virtualmente, num modelo de navegação como nunca se pôde antes imaginar. Se existe crise? Claro que sim, e disso dão prova as empresas especializadas que diminuem drasticamente os seus quadros, principalmente em função do aperfeiçoamento dos seus processos de reengenharia. A opulência inicial cedeu lugar a um esforço mais contido, em que as universidades corporativas passaram a receber um grande destaque.
O que se espera é que os materiais de apoio sejam de boa qualidade e que se processe um aprendizado coletivo, cooperativo, como é próprio dessa modalidade, que está longe de poder ser confundida com um supletivo de segunda categoria.
E a chave do mistério encontra-se na forma como se arregimentará o corpo docente desses cursos. Na Inglaterra, para o início das atividades da Universidade Aberta, foram selecionados os 500 melhores professores do Reino Unido. Aqui, sem dúvida, o mesmo precisará ser feito - e com urgência - para garantir a excelência dos cursos, além da sua credibilidade.
Não se pode admitir que sejamos incapazes de levar a sério uma iniciativa que hoje, no mundo desenvolvido, claramente está dando certo.
O Globo em 25/01/2002