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Antônio Carlos Vilaça

 

É assim mesmo. Morreu Antônio Carlos Vilaça, no sábado, 28 de maio. Apenas uma pequena informação, na seção dos anúncios fúnebres, noticiando o seu falecimento, providência de anônimos que o admiravam. Estava abrigado no asilo São Luís, destinado a idosos sem família e sem recursos, em fase de doença terminal. Durante algum tempo, por iniciativa de Marcos Almir Madeira, ocupava um quarto na sede do PEN Club do Brasil. Com a morte de Madeira, acho que foi despejado e foi parar num asilo.


Vilaça escreveu uma obra-prima, "O Nariz do Morto", que foi saudado pela crítica como ponto alto de nossa memorialística, colocado acima de Joaquim Nabuco, de Gilberto Amado e de Pedro Nava. Na realidade, escrevia melhor do que todos eles, tivera apenas uma existência mais modesta, nada de espetacular em sua vida. Ganhou a mais alta láurea da nossa literatura, o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, que já premiou Guimarães Rosa, Rachel de Queiroz, Gilberto Freyre, Fernando Sabino e, neste ano, premiará Ferreira Gullar.


Poucos escreveram tão bem, tão limpamente e tão profundamente. Conhecia a literatura universal como um "scholar", sabia de cor trechos e mais trechos dos clássicos, de Homero a Juan Rulfo. Mas seu grande assunto era a santidade que não encontrou nas diversas ordens religiosas em que foi buscar o caminho não para se tornar santo, mas para entender a santidade dos outros. Fez noviciado entre jesuítas, dominicanos, beneditinos, buscou diversas ordens monásticas e até mesmo o sacerdócio secular.


Nada lhe matava a fome de eternidade. Na solidão, o grande crente parece que se tornou descrente de tudo. A doença deformou-o, mas não afetou a sua lucidez, a ânsia de entender o homem. Morreu só. Se existe um céu, seja de que religião for, Vilaça estará nele, pela sua alegria e pelo seu sofrimento.




Folha de São Paulo (São Paulo) 07/06/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 07/06/2005