Há um mundão de piadas sobre equívocos sociais que todos cometemos, uns mais, outros menos. Trocar nomes ou ofícios de pessoas talvez seja o mais comum, criando embaraços para as duas pontas em questão. Bem verdade que há sempre um jeito de consertar as coisas, educadamente, aliviando o inicial constrangimento provocado pelo engano de pessoa ou de ofício.
Mas, quando se trata de defunto, a coisa é mais séria. Já fui a missas de sétimo dia erradas e acompanhei o Adolpho Bloch num enterro que teve duas etapas igualmente vexatórias.
Morrera um capataz, um desses italianos que administram dezenas de bancas de jornais e revistas, amigo de Adolpho dos velhos tempos. Como sempre acontecia em casos assim, ele fazia questão de ir ao enterro e, na hora do sepultamento, jogar na cova os últimos exemplares de suas revistas - "Manchete", "Fatos & Fotos", "Pais & Filhos" etc.
A secretária dele errou de cemitério, fomos dar no Caju, onde, por coincidência, estava sendo enterrado outro italiano, também chamado Giuseppe. Adolpho chorou devidamente (chorava quando queria), deu pêsames a todos os familiares e jogou suas revistas na cova do italiano.
Quando voltamos para o carro, soubemos que o capataz falecido estava sendo enterrado em outro cemitério. Fomos para lá. O estoque de revistas que ele levara havia se esgotado. Coisa equivalente no carro era um exemplar do último balancete do Banco do Brasil. Por azar, o capataz já havia sido sepultado, mas, para desgraça nossa, havia um José sendo enterrado na hora em que chegamos.
Adolpho me perguntou se Giuseppe e José eram a mesma coisa. Eu ia dizer que sim, mas nem foi preciso. Ele jogou o relatório assinado pelo Ernâni Galvêas em cima do caixão, abraçou todos os presentes e chorou no ombro de uma mulher que parecia a viúva. Sendo ou não a viúva, para ele dava na mesma.
Folha de São Paulo (São Paulo - SP) em 12/02/2004