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Einstein e eu

 

Como todos sabem, após a morte de Einstein, em 1955, o patologista de plantão no hospital universitário de Princeton, Thomas S. Harvey, fez a autópsia do cadáver e, por conta própria, tirou o cérebro do gênio e levou-o para casa a fim de estudá-lo e descobrir onde se localizava a genialidade do falecido. Foi demitido.


Mas persistiu nos estudos, seccionando o órgão em 200 pedaços que foram analisados por vários cientistas. Em 1993, um deles, S.S. Kantha, do Instituto de Biocência de Osaka, no Japão, estudando a parte que lhe coube, concluiu que uma falha na região conhecida como "área de Brodmann 39" explicaria o fato de Einstein só ter começado a falar depois dos três anos de idade.


Aí é que entro eu. Nasci na mesma data do gênio, 14 de março - com alguns anos de diferença, é lógico. Na mesma data nasceram Castro Alves, Glauber Rocha e Abdias Nascimento. Em termos zodiacais, eu estaria bem acompanhado. Não seria por aí que explicaria meus fracassos e penas.


Acontece que também fui mudo até os cinco anos, superando Einstein folgadamente com a tal falha na área de Brodmann 39. Se a genialidade dele se explica pela falha no complicado sistema de seus neurônios, eu deveria ser mais gênio do que ele. E, ai de mim!, mal passei das quatro operações, que custei a aprender e que hoje domino relativamente bem com o auxílio de uma minúscula contadora eletrônica que comprei num camelô da rua Senhor dos Passos (custou R$ 10; pagando R$ 15 poderia ter levado duas).


Espero que, após a minha morte, nenhum cientista, nenhum faxineiro de hospital se apodere do meu cérebro para estudar a tal falha que, em vez de me tornar gênio como Einstein, me fez incapaz de compreender não apenas as teorias da relatividade, a física quântica e a expansão do universo como, descendo ao nível da humanidade comum, nem mesmo a birra que se criou contra o Severino Cavalcanti.


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 18/06/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 18/06/2005