Nunca se soube exatamente porque acabou o título de Escola Normal, que começou exatamente com a primeira delas, no século 19, na cidade de Niterói. O auge dessas instituições, espalhadas pelo Brasil, pode ter ocorrido entre as décadas de 40 a 70. Formaram os melhores professores e certamente tinham os melhores mestres. No Rio, rivalizavam com os do clássico Colégio Pedro II, padrão de excelência nacional.
No começo dos anos 40, morador na rua Senador Furtado, bem defronte ao tradicional prédio da rua Mariz e Barros, na Tijuca, fui matriculado por meus pais no jardim de infância. Eu e minha irmã Rachel, um ano mais nova.
Como era difícil atravessar a rua, tráfego intenso, inclusive de bondes, éramos levados cada dia por um irmão mais velho (são três) e entregues à professora Paulina. Esta, que depois se tornaria minha amada sogra, lembra que era cada dia um irmão diferente, e sempre com a mesma atitude: "Cumprimentem a professora." Esticávamos os bracinhos e cumpríamos a tarefa. Pronto, o irmão dava as costas e voltava para casa. Na época, tinha cinco anos. Foi a minha primeira escola - e pública.
Vivia ali um ambiente de felicidade. As atividades eram agradáveis, dormia-se depois do almoço, ouvindo música que vinha de um vitrolão situado no centro do pátio, e a esteira fazia o papel de cama, aliás, confortável. Como não existia televisão, era mesmo na escola que nos ambientávamos com as letras do nosso alfabeto. Posso proclamar que aprendi a ler e a escrever na Escola Normal do Rio de Janeiro. Isso é muito importante na formação do indivíduo. E é sempre considerado quando a vida nos leva pelos caminhos traçados pelo destino.
A lembrança da dona Paulina, falecida aos 90 anos, não nos sai da cabeça. Misto de amor e gratidão pelos primeiros tempos na escola. Ela, aliás, fazia questão de contar a história. Lembrou-se de mim, anos mais tarde, porque se recordou do sobrenome esquisito e das figuras dos irmãos sempre educados. Ela foi responsável por mim exatamente no ano em que estava grávida da sua primeira filha, Gilda. Vinte e cinco anos mais depois, casei com a sua segunda filha, Ruth. Felizes para sempre.
Anos mais tarde, voltei à sede do Instituto de Educação. Não era mais o aluno ou o professor, mas o secretário de Estado de Educação e Cultura. Providenciei enorme reforma na sede, incluindo a recuperação da sua piscina e do seu teatro, que batizei com o nome do educador Fernando de Azevedo. Palco de grandes realizações de arte-educação, como foram os Festivais Estudantis de Música Popular Brasileira e Teatro. Emocionante as entregas dos prêmios, divididos entre grupos da capital e de muitas cidades do interior fluminense.
O Instituto de Educação também foi palco de aulas excepcionais. Grandes mestres por lá passaram, deixando lições admiráveis. Não há uma data para marcar a decadência da instituição. Certamente deve ter sido a partir da Lei no 5.692/71, quando a profissionalização se tornou obrigatória e houve uma absurda generalização, sem condições para isso. Fizeram gato e sapato das boas escolas. Quando isso acabou, o estrago estava feito. Mas a imagem soberana e competente da Escola Normal jamais foi esquecida. É o que a Faetec/RJ busca hoje resgatar.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 19/06/2005