O oficiante da missa de 7º dia, no Mosteiro de São Bento, no Rio, pediu aos presentes uma salva de palmas para a professora Cecília Barreto Parreiras Horta, falecida uma semana antes. Talvez nunca se tenha visto, naquela bonita e histórica igreja, tamanha manifestação de comoção e solidariedade: foram minutos aparentemente sem fim, coroando uma vida bonita de dedicação e apreço ao próximo. Era uma verdadeira educadora, com o entusiasmo próprio de quem tem Deus no coração (a palavra entusiasmo contém Théo, Deus em grego).
A doença insidiosa foi enfrentada por Cecília, ao lado dos familiares, sobretudo do marido Luís Paulo, de forma heróica. Quando o tratamento permitia, jantava com os amigos, comparecia aos espetáculos do Teatro Municipal, fazia de conta que não era com ela. Mulher bonita e corajosa, não queria que os seus parentes e amigos sofressem pela sua doença. Que ela, muito religiosa, compreendia como um desígnio de Deus.
Assim que Ele a chamou, fechando os seus lindos olhos, iniciou-se uma nova vida, sem os óbices da condição humana e as vantagens da eternidade. Flor que era, levou o seu perfume ao céu, tomando a vaga que lhe cabia ao lado do Todo-poderoso.
Cecília era de uma família de educadores. Chegamos a conhecer de perto o seu pai, Barreto Filho, um destacado machadista e homem de leis, sobretudo pedagógicas, tendo presidido por muitos anos o respeitável Conselho Federal de Educação, ainda na fase em que trabalhava no Rio de Janeiro, com todos os mitos de então. Muitas leis saíram desse órgão, sob o comando de Barreto Filho, o que hoje não é mais lembrado com tanta freqüência, como é da tradição brasileira. Somos mesmo um País de curta memória.
Na missa, estavam presentes mais de 40 alunos do Colégio São Bento. Uniformizados, todos meninos, cantaram diversas músicas em homenagem a Cecília. Todas de fundo religioso, que era da sua natureza.
Na ocasião, foi dito que ela era uma guerreira, sem perder a doçura. Mulher com a fibra dos macabeus, uma feliz e oportuna lembrança do Velho Testamento e que retrata o temperamento da nossa querida Cecília. Daí a força do seu trabalho junto aos alunos das escolas em que brilhou como mestra. Uma delas, com a significativa abreviatura de CEL (céu?). Premonição?
Sabemos que Cecília não morreu. Talvez tenha se encantado, como disse o escritor famoso. Sua imagem terrena é muito bonita, pois na verdade ela soube combater o bom combate, como afirmou o padre Max, de forma extremamente carinhosa. Foi assim como filha, irmã, esposa, mãe, educadora, exemplar em tudo o que fez, com um senso muito especial de responsabilidade e de coragem diante da vida. Pena que não tenha ficado mais uns anos conosco. Revelamos esse egoísmo, mesmo sabendo que, onde hoje se encontra, estará velando por todos aqueles que a amaram e admiraram, que somos todos nós. Cecília querida, descanse em paz. Em vez de chorar, sorriremos sempre na sua lembrança.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 20/11/2005