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Ticos-ticos no fubá

 

Não sei como vai terminar (se é que vai terminar mesmo) a briga do governo com o Severino a propósito da agenda da Câmara dos Deputados. Fatalmente haverá barganha, o tradicional, o inevitável toma lá dá cá. Mas a razão está com Severino, por mais que o critiquem e esculhambem por ser um político fora do esquadro, politicamente incorreto, odiado e debochado pela mídia.


Não vem ao caso discutir os motivos reais e pessoais pelos quais ele decidiu comprar a briga contra as medidas provisórias que além de entravar a Câmara, paralisando-a há quase um mês, são uma aberração, uma exorbitância do Executivo, e não deixam de ser uma disfarçada manifestação de autoritarismo.


Sabemos que as MPs foram criadas para enfrentar problemas relevantes e urgentes. Tudo bem. Em qualquer país democrático, de uma forma ou outra, com esse ou aquele nome, elas existem para enfrentar calamidades ou emergências administrativas.


Mas o caso brasileiro é diferente. Elas dão a cada governo (e FHC abusou delas como Lula está abusando) o poder autoritário do decreto-lei que é o atributo fundamental das ditaduras, das tiranias de esquerda ou direita.


É pasmosa a relação das últimas medidas provisórias solicitadas pelo governo ao Congresso. Uma delas foi sobre o fubá e não beneficia sequer os ticos-ticos, que sabidamente o apreciam.


Anuncia-se que Lula e sua equipe estão dispostos a dobrar a obstinação de Severino e a resistência de grande parte da Câmara. Farão tudo em troca da continuidade do processo, ou seja, governar por decretos-leis ou por MPs, que dão na mesma.


A resistência de Severino fatalmente terá um preço, e é com esta possibilidade, realmente possível, que os aliados do governo estão jogando. Infelizmente, a opinião pública ainda não despertou para a distorção operacional que entrava projetos de maior relevância, como algumas reformas transformadas em ticos-ticos bloqueados no fubá.


 




Folha de São Paulo (São Paulo) 09/05/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 09/05/2005