Um dos raros consensos de nosso tempo é o da ausência de heróis, de gigantes na paisagem humana e intelectual deste início de século. Tirante um desportista excepcional, como Ayrton Senna, um mito como Guevara, um personagem polêmico, mas denso, como João Paulo 2º, o cenário em que vivemos é marcado pela mediocridade de atores, de figurinos e de enredos.
Em compensação, o elenco de apoio é farto de vilões, nunca houve tantos, e tão variados. Como excelentes vilões, têm vida breve e atuação datada, mas, enquanto estão atuando, roubam a cena de tal forma que fica impossível ignorá-los.
Numa lista apressada, sem necessidade de amplas pesquisas, temos na "pole position" alguns personagens que nos irritam pela monotonia com que sempre ocupam os espaços vazios do noticiário. No plano internacional, a dupla Bush-Blair produziu uma tróica com o desassombrado reforço de Rumsfeld. A este último ficamos devendo uma informação valiosa: a verdadeira história do nosso tempo, que começou em 11 de setembro de 2001 e ainda não acabou, apesar da ocupação do Iraque e da captura de Saddam Hussein, tem muitos lances mais deprimentes do que as fotos dos prisioneiros torturados pelos soldados norte-americanos.
No plano nacional, nossos vilões são mais divertidos. O decano deles parece que é Paulo Maluf, que gerou um subproduto de peso, que ameaça o estrelato que estava reduzido ao Waldomiro e ao Cachoeira. Foi emocionante ver pela TV a ordem de prisão dada ao ex-prefeito Celso Pitta, prisão que não valeu, pois nada no Brasil parece valer a pena, temos a alma pequena.
Os atores, como se vê, até que se esforçam para dar graça ao espetáculo. O problema é mesmo o roteiro, de uma indigência proporcional à magnitude da corrupção. Um roteiro mal-escrito, monótono, sem novidades, mas bem realizado.
Folha de São Paulo (São Paulo - SP) 12/05/2004