Poucas vezes na história da comunicação de massa houve um fato que concentrasse tantas e tamanhas atenções. No final da 2ª Guerra Mundial, não havia TV nem internet. No atentado do World Trade Center, a tragédia foi fatiada pelas investigações policiais e implicações políticas. Não houve emoção. Houve estupor.
A morte de João Paulo 2º, mais do que anunciada, envolveu ingredientes emocionais pelo tipo de homem que foi e pelo tipo de líder que ele se tornou. Inicialmente, apenas o chefe de uma religião poderosa, mas não única. O catolicismo, com seu bilhão de adeptos, representa apenas um sexto da população mundial. Não seria essa a causa da emoção pelo seu desaparecimento se atentarmos para o fato de que grande parte dos católicos contestavam não a sua liderança, mas a sua atitude diante de problemas que estão na ordem do dia, desafiando não apenas a linha oficial do Vaticano mas a legislação civil de diversos países.
No entanto todos concordam que o papa Wojtyla soube empolgar multidões as mais variadas. Nenhum pop star conseguiu reunir tanta gente para ouvir suas palavras, mesmo que não concordasse com elas.
Independentemente dos credos e das opiniões divergentes, mesmo entre os católicos de carteirinha, houve o consenso. Estávamos diante de um homem desarmado, sem poder civil ou militar, que pregava a concórdia entre todos os homens, a paz entre as nações, a fé e, acima de tudo, a esperança numa humanidade mais justa. Se atentarmos às aparições públicas de João Paulo 2ª, notaremos que, subliminarmente, ele nunca deixou de ser um fabuloso ator, que não precisava dançar nem cantar -é bem verdade que muitas vezes cantava, inclusive o "Cidade Maravilhosa" no Rio e a "Marselhesa" em Paris.
Não foi por aí que o papa se tornou o fenômeno audiovisual do nosso tempo. Ele falou ao coração de todos, acreditando que o homem poderia ser melhor.
Folha de São Paulo (São Paulo) 10/04/2005