Um jogador argentino xingou adversário brasileiro. Quem já foi à Argentina sabe que os brasileiros, brancos ou negros, são ali chamados de "macaquitos", tanto nas conversas íntimas como no anedotário local. Na "brincadeira", segundo dizem. Retribuímos a "brincadeira" chamando os argentinos com o nome de outro animal.
São lamentáveis, mas comuns, os trancos de um jogo que seguidamente inclui socos, pontapés e cusparadas. Provocam expulsão do campo, mas somente em casos raríssimos são enquadrados no Código Penal. São agressões físicas ou morais que ocorrem numa situação específica e transitória. Não há esporte coletivo em que um jogador não chame outro de alguma coisa, sem poupar a mãe, a pátria, a cor e a religião do adversário.
O racismo está entranhado na sociedade brasileira e em outras sociedades. Apesar da vasta literatura oficial que nega esse tipo de preconceito, as comunidades negras sabem e não deixam de proclamar que continuamos racistas.
Há lei que o condena. O ofendido a invocou, o ofensor foi preso, libertado sob fiança e será processado. Um exemplo para todos os que são xingados no trânsito, nos esbarrões de rua, nas reclamações de troco, nos incidentes que ocorrem a cada minuto.
Além de criminoso, o racismo é odioso quando discrimina candidatos ao emprego ou é praticado por hotéis, restaurantes, prédios públicos ou residenciais, escolas, bancos etc. Numa partida de futebol, é apenas criminoso. Associaram o nazismo ao reprovável gesto do argentino, como se o racismo fosse invenção dos nazistas. Nos Estados Unidos, bem antes de Hitler, havia escolas e mictórios para negros e brancos. Os ônibus eram também divididos.
Na selva do trânsito, todos chamamos e já fomos chamados disso ou daquilo. Incluindo mãe, raça, religião e defeitos físicos.
Folha de São Paulo (São Paulo) 18/04/2005