Não sei não, mas o presidente da República que mais mudou ministério foi JK. Dizia ele que não tinha compromisso com o erro: quando sentia que um ministro ou auxiliar não estavam dando conta da tarefa que lhe atribuíra (ele tinha 30 metas a cumprir), o mundo podia vir abaixo, mas ele substituía o ministro que não estivesse sintonizado com o seu ritmo de trabalho e as suas prioridades.
Não dava bola para a base de sustentação no Congresso. Praticamente governou sem essa base, sofrendo o diabo com a oposição, que era contra tudo o que ele fazia e até contra o modo como agia em sua vida pessoal. Da mídia nem se fala. Foi chamando de "o grande cafajeste" pelo jornal mais influente da época, e Carlos Lacerda urrava diariamente contra ele, pedindo que os militares o derrubassem. Aliás, por duas vezes, oficiais da Aeronáutica, incentivados por Lacerda, tentaram depô-lo nas rebeliões de Jacareacanga e Aragarças.
Corte rápido para este parto difícil, enigmático e estéril do ministério com que Lula pretende terminar os dois anos deste mandato -que muitos acreditam ser o primeiro.
Como não há metas a atingir, apenas promessas bem intencionadas de melhorar tudo, qualquer ministro serve, desde que, atrás dele, existam x ou y congressistas que aprovarão as MP que o governo mandar, ficarão alertas para impedir CPIs, darão, enfim, aquilo que o PT e o próprio Lula chamam de "governabilidade". Por mais que critique Lula, gosto dele pra burro, admiro-o e até o invejo pela capacidade de manter, intacto, o seu jeitão de brasileiro comum, "demônio de Garanhuns", como recentemente se definiu, numa tirada genial, que, não sei por que, me fez lembrar alguma coisa de dom Pedro 1º.
Até mesmo nessa questão do ministério, acredito que ele gostaria de imitar JK, mas os tempos são outros. É preciso contentar a fome de alguns políticos e a gula de outros por cargos, verbas e mordomias.
Folha de São Paulo (São Paulo) 15/03/2005