Mais uma vez, e como sempre, estou na contramão do consenso, um dos quais, em época eleitoral, é a importância do debate na TV entre os candidatos a cargos eletivos. Os marqueteiros e colunistas especializados acreditam que Kerry diante de Bush, ou Marta diante de Serra, consumidos pelos milhões de telespectadores que acumulam a função de eleitores, ganharão ou perderão de acordo com a performance diante das câmaras.
É evidente que um ou outro eleitor assistirá ao debate e, se estiver indeciso, poderá decidir se vota em A ou em B. Esse contingente de indecisos é pequeno. Nos Estados Unidos, onde o voto não é obrigatório, há a tendência de se votar num dos partidos, há o voto republicano e o democrático - e este voto é que decide a questão.
No Brasil, onde praticamente não há partidos, o eleitor vota em nomes, caras e bocas, quase que da mesma forma como torce pelo Flamengo ou pelo Vasco, e não espera a última partida entre os dois para mudar de time. Tal como nos Estados Unidos e em outros países, a turma dos indecisos é pequena.
Dizem que o último debate entre Collor e Lula, em 1989, decidiu a fatura em favor do primeiro. Realmente, Collor se saiu melhor naquela ocasião, mas ele ganharia de qualquer maneira. Sua campanha estava bem azeitada, com imensos recursos, e havia o medo de uma vitória do PT. Lula não seria eleito naquela ocasião nem mesmo se fizesse chover e descobrisse onde estão os ossos de Dana de Teffé.
O mesmo se poderá dizer de Kerry e de Bush, de Marta e de Serra. Um fato novo, de última hora, poderá mudar o voto do eleitorado. Mas não um fato produzido, como o debate na TV. Prova disso foi a vitória de Cesar Maia no primeiro turno, aqui no Rio. Os seus concorrentes uniram-se para torpedear o prefeito, apontando as falhas de sua gestão, que são e continuam sendo muitas. Não adiantou.
Folha de São Paulo (São Paulo) 23/10/2004