Quando se pretende trabalhar sobre os conteúdos das emissoras de rádio e televisão, estimulando a qualidade e, se possível, também o bom gosto, longe está qualquer preocupação com os mecanismos da censura. Isso é uma questão de outros tempos, quando tivemos de conviver com o autoritarismo indefensável. Hoje, qualquer medida que cheire a cerceamento da liberdade de expressão terá a repulsa da sociedade brasileira.
Mas há certas questões que precisam ser bem entendidas. Como concessões do Governo, as emissoras devem respeitar a razoabilidade de certos parâmetros. Quando o Ministério da Justiça promove a classificação de filmes, por exemplo, está exercendo o seu papel moderador. É um problema de respeito à lei vigente, do qual não se pode dissociar. Querem uma prova concreta?
Diz-se que determinado filme (em geral do exterior) em TV aberta só pode ser exibido a partir das 23 horas. Há razões para isso, principalmente o seu caráter nitidamente moral. Se a lei afirma que palavrões e cenas pornográficas só serão permitidos, mesmo que virando o nariz, a partir de determinado horário, como é que existem emissoras, sob argumentos os mais pueris, que desobedecem as normas e antecipam a sua exibição para horários incompatíveis?
Veja-se que é dura a caminhada para se chegar a uma comunicação de massa palatável, sem fugir ao fundamental princípio da liberdade de expressão, que não é sinônimo de licenciosidade. Vemos com simpatia a existência de um código de ética, elaborado não pelo Governo, mas pelas próprias emissoras e produtores de programas. Não há qualquer ofensa aos princípios democráticos quando se pensa assim.
Na verdade, com as duplicidades e omissões da legislação sobre telecomunicações e radiodifusão, urge oferecer ao Congresso Nacional, como é obrigação do Conselho de Comunicação Social do Senado Federal, um anteprojeto da Lei de Comunicação de Massa, antes bastante discutido, inclusive com a colaboração das Comissões de Educação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Insistiremos muito na evolução desse projeto.
Assim, estaremos dando conseqüência aos dispositivos legais que reservaram ao CCS atribuições para a realização de estudos, pareceres, recomendações e outras solicitações a respeito do Título VIII, Capítulo V, da Constituição Federal, para lidar com temas como a liberdade de manifestação do pensamento, programas comerciais de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias; produção e programação de emissoras de rádio e televisão; monopólio ou oligopólio; promoção da cultura nacional e regional, e estímulo à produção independente e à regionalização da produção cultural, artística e jornalística, além da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal de radiodifusão; defesa da pessoa e da família relativamente a programações de rádio e televisão contrárias ao disposto na Constituição Federal; outorga e renovação de concessão, permissão e autorização de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens; e legislação complementar sobre dispositivos constitucionais referentes à comunicação social. Como se vê, não é pouca coisa.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 21/03/2005