Sábado de dezembro, em frente à árvore de Natal, aqui na Lagoa. Na igreja de São José, redonda, paredes de vidro, o casal celebra bodas de ouro, filhos, netos, parentes. De repente, as paredes ficam estilhaçadas. Todos se deitam no chão, padre, sacristão, fiéis e infiéis.
Do lado de fora, dois homens, com um pacote embrulhado em papel cheio de sinos e Papais Noel, entram no edifício mais próximo. Os homens aproveitam o carro que está saindo da garagem do prédio, rendem o motorista e o porteiro, sobem para assaltar qualquer apartamento.
O porteiro consegue se livrar. Pede socorro. Um policial que ia passando dá um tiro e intimida os assaltantes, que fogem. Roubam uma moto e escapam. Na altura da Vila Hípica perdem o controle da moto e caem. Há um Chevette logo ali, entram nele, as chaves ficaram no painel, mas o carro está enguiçado, é atingido pelos tiros do policial.
Abandonam o Chevette e pegam um Escort que também ia passando. Matam o motorista e dirigem-se para o Jardim Botânico. Logo adiante, na rua Maria Eugênia, batem num Logus que estava parado. Abandonam o Chevette e invadem o prédio em frente.
O tiroteio não pára: na rua, os policiais. Dentro do prédio, os assaltantes. Na igreja, o padre conta os disparos: 50 tiros arrebentaram as paredes de vidro da igreja. Os fiéis esqueceram a missa.
No prédio ao lado, um cinemaníaco alugara o vídeo predileto. Está se deliciando com um assalto em Denver, no Colorado, bandidos em fuga atiram numa igreja, roubam um Mercedes que ia passando, fogem, batem num carro e em outro, policiais atiram, os assaltantes atiram.
Um padre não conta os tiros nas paredes, que não são de vidro. Abaixa-se, apanha um são José que caiu ao chão. Os tiros mutilaram a imagem: está sem o Menino Jesus ao lado, pedindo proteção. (Com agradecimentos à reportagem de "O Dia" e à videoteca Quanto Mais Quente Melhor).
Folha de São Paulo (São Paulo) 06/12/2004