Parece que Deus existe mesmo. Ao tomar posse no segundo mandato, George W. Bush reconheceu que a imagem dos Estados Unidos sofreu graves arranhões, está mais suja do que pau de galinheiro no resto do mundo. Pudera.
E foi exatamente Bush quem mais sujou a imagem de seu país ao invadir e destruir um país alegando uma falsidade, agora oficialmente desmascarada. Bastava isso para jogar a imagem dos EUA no chão.
Mas não exageremos. A imagem que está enlameada não chega a ser a do país chamado Estados Unidos da América do Norte. É a imagem de Bush e de seu governo, que perderam a compostura e a dignidade que se exige da equipe que dirige o país mais poderoso da atualidade. País que nos deu Cole Porter, Fred Astaire e Ginger Rogers, Thomas Alva Edison, Melville, Faulkner, Orson Welles, Allan Poe, o Gordo e o Magro, o ice-cream-soda, Louis Armstrong e, sobretudo, Martin Luther King e as pernas de Cid Charisse.
Esse pacote artístico e cultural transcende erros e crimes do Departamento de Estado não só na recente invasão e ocupação do Iraque mas nas atividades antigas e permanentes da CIA no mundo todo. E no Consenso de Washington, que faz os países pobres se tornarem miseráveis.
Não creio que Bush, apesar da confissão, vá adotar um comportamento menos reacionário. Ele continuará se achando um iluminado, um messias em missão salvadora na Terra. Seria bom que Tony Blair, Berlusconi e outros aliados no estupro cometido no Iraque reconheçam a estupidez que fizeram.
Uma delas, talvez a mais sintomática: obrigaram Colin Powell, um moderado, um homem decente, a exibir fotos e argumentos falsificados pelo próprio governo para justificar a invasão do Iraque. Uma armação denunciada pela consciência universal, denúncia que os Estados Unidos de George W. Bush desprezaram com arrogância e brutalidade.
Folha de São Paulo (São Paulo) 22/01/2005