Aterrado, literalmente aterrado, pois se trata de uma tragédia que envolverá terra e Terra, li no último domingo o excelente artigo de Rogério Cezar de Cerqueira Leite, professor emérito da Unicamp, sobre o péssimo futuro que nos aguarda.
Para falar a verdade, mesmo sem ser cientista como ele, sempre suspeitei que tudo termina mal, inclusive a aventura do homem na face da tal Terra, que sofrerá tantas e tamanhas modificações que já podemos considerar a humanidade em fase de extinção.
Entre as desditas que nos abaterão, entre as quais Rogério dedica boa parte de seu texto às fontes de energia, a que mais me assustou foi o degelo da calota polar da Antártida, que elevará em cinco metros o nível da água dos mares. Um tsunami universal, tamanho família, destruiria todas as orlas onde vive um terço da população mundial, inclusive, e principalmente, eu, que vivo e moro ao pé de um oceano. (Gosto da expressão machadiana e, sempre que posso, uso e abuso desse "ao pé").
Já fiz cálculos pessoais a respeito. Uma elevação de até dois metros, troço pra burro, não chegaria a me afetar, estou precariamente defendido pelo morro dos Cabritos, onde, aliás, nunca vi um só cabrito, mas a faxineira daqui de casa já viu um disco-voador pousado nele.
Agora, se o Atlântico transbordar cinco metros, como nos avisa o Rogério, terei de tomar imediatas e enérgicas providências. A mais lúcida será também radical: mudar-me para Campinas, onde mora o Rogério. Com mais de cinco metros acima do nível do mar, com alguns benditos quilômetros de distância, será um lugar seguro para me abrigar e abrigar meus trecos.
Apelando para a admiração e a amizade que me ligam ao professor emérito da Unicamp, só espero que ele me avise a tempo, ainda que reservadamente, para evitar um pânico geral. Nunca pensei em ir embora para Pasárgada, como quis o poeta. Mas ir para Campinas salvará a minha pele.
Folha de São Paulo (São Paulo) 26/01/2005