Fiquei triste ao ler nas folhas que o presidente Lula usou um colete à prova de balas na sua recente ida ao Fórum de Porto Alegre. Vendo-o nas TVs, estranhei o blusão rechonchudo que usava, fazendo-o mais gordo do que é, mas sem estragar o visual, que geralmente é bom e simpático.
A tristeza é que se há ou houve um chefe de Estado que não merece a precaução de um atentado (vaia não é atentado) é o atual presidente do Brasil, boníssima alma, apesar dos erros gramaticais mais primários que comete cada vez mais, e do erro maior -este sim, estrutural, danoso ao país e ao povo que ele diz amar.
No varejo, no operacional, entre equívocos e acertos, acredito que Lula vai bem, dentro do possível e do cenário maldito que herdou de seu antecessor. Os dois programas sociais que lançou são duas bobagens. Não compete ao Estado distribuir comida aos famintos. As carências que o Brasil sofre não podem ser consideradas emergenciais, cataclismos eventuais como o tsunami da Ásia que nos obriga a mandar remédios, comida e cobertores para socorrer os sobreviventes.
A principal, para não dizer única obrigação do Estado, é criar condições estruturais para que não haja fome, desemprego e miséria. Combater os sintomas é o mesmo que tentar curar um câncer distribuindo ervas de Santa Maria aos doentes. Pode aliviar a dor, mas não cura o mal. Em casos extremos, é necessário cortar fundo.
O atual governo acerta no factual algumas vezes, mas enquanto adotar a prioridade econômica que faz um banco lucrar R$ 3 bilhões ao ano, enquanto privilegia o capital especulativo e não libera verbas aprovadas pelo Congresso e necessárias para obras urgentes, merece realmente vaias mas não atentados na pessoa do presidente.
Certa vez, nos anos 50, esbarrei com um homem e sorridente que saía de um restaurante no centro da cidade, acompanhado apenas de um amigo, o poeta Augusto Frederico Schmidt. Sem segurança, sem colete à prova de bala. Era JK.
Folha de São Paulo (São Paulo) 31/01/2005