A maior contradição da humanidade se resume a uma constatação: otimistas e pessimistas têm razão. Pertenço à última categoria, tenho motivos para ser pessimista, mas, admito, vou além, admiro os otimistas, até certo ponto os invejo, embora acredite que são ou estão mal-informados.
Em geral, os otimistas quebram a cara mais cedo ou mais tarde, daí que sou solidário a eles, já que nasci de cara quebrada. Meu pai era otimista desvairado, passou anos tentando aprender datilografia e, ao contrário do Ziraldo, que foi mestre e orador de turma formada na Casa Pratt (especializada em cursos para vender máquinas homônimas), o pai nunca passou de catador de milho, embaralhando-se com as teclas. Quando acertava uma frase, descobria que não era aquilo que desejava escrever. Tampouco desanimou. Acreditava, como o Lula, que chegaria lá.
Mas admiro também o velho do Restelo, aquele cara que Camões colocou no cais de onde partiram as caravelas para vencer os oceanos e descobrir a rota das Índias. O grande Vasco abriu o caminho para o Novo Mundo - e o velho ficou no cais, amaldiçoando aqueles que botaram "uma vela em frágil lenho".
Lenho frágil, o das caravelas, impulsionadas pelos ventos que enchem as velas, ventos traiçoeiros que varrem os mares, levando para longe das mães, mulheres e filhos os marinheiros que não voltam, morrendo de febres e naufrágios.
Não fora a audácia dos otimistas, viveríamos ainda nas cavernas, comendo os animais que caçássemos e puxando nossas mulheres pelos cabelos. O tempo dos pessimistas passou, ficou fora de moda. Ao contrário do velho do Restelo, aplaudimos os heróis que embarcam em naves espaciais para trazer uma pedra da Lua.
Aqui do meu canto - ou da minha caverna -, fico pensando no interesse que não tenho pelas pedras da Lua. De nada me serviram nem servirão. Nem por isso deixo de admirar os que partem em frágil lenho, buscando alguma coisa.
Folha de São Paulo (São Paulo) 1/2/2006